Decreto-Lei n.º 304/87, de 4 de Agosto

Formato PDF

Decreto-Lei n.º 304/87

PÁGINAS DO DR : 3023 a 3026

O regime legal da primeira venda de pescado fresco foi actualizado em 1979, através da publicação do Decreto-Lei n.º 147/79, de 24 de Maio.
Sete anos volvidos permitem constatar os benefícios que tal sistema contém, nomeadamente como método extremamente eficaz no encontro da oferta com a procura, mas permitem também concluir ser tempo de de novo se proceder à sua actualização, visando-se desta feita não só clarificar o já estatuído como também introduzir novas disposições de forma a nele se acolher uma maior diversidade de processos de comercialização, sem prejuízo de, simultaneamente, se introduzirem as disposições necessárias à implementação das medidas de controle de qualidade e de gestão e conservação dos recursos pesqueiros.
A tudo isto acresce a necessidade de, globalmente, adaptar o regime da primeira venda de pescado fresco aos princípios e regras comunitários, adaptação essa, por um lado, indispensável face ao surgimento de novas formas de associação dos produtores, cuja vocação e objectivos os tornam parceiros indissociáveis de qualquer regulamentação da actividade económica e, por outro, irrecusável face às responsabilidades acrescidas ao Estado enquanto sujeito ao direito comunitário.

Assim:
O Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:

Artigo 1.º

A primeira venda de todo o pescado fresco será obrigatoriamente efectuada pelo sistema de leilão a realizar em lota, sem prejuízo do disposto no artigo 4.º

Artigo 2.º

Para efeitos de aplicação do presente diploma, entende-se por:
a) Lota – infra-estrutura em terra implantada na área de um porto de pesca ou em zona ribeirinha na sua influência, que integre o local coberto ou descoberto, devidamente aprovado e licenciado para a realização das operações de recepção, leilão e entrega de pescado e outras operações que lhe são inerentes ou complementares, compreendendo a descarga, manipulação, conservação ou armazenagem;
b) Pescado fresco – os animais subaquáticos (crustáceos, moluscos, equinodermes, ciclóstomos, peixes, batráquios, répteis e mamíferos) que não tenham sofrido desde a sua captura qualquer operação de conservação, excepto refrigeração com ou sem adição de gelo fragmentado simples ou misturado com sal ou que tenha sido conservado a bordo em água do mar ou em salmoura refrigerado;
c) Organizações de produtores – toda a associação constituída por iniciativa dos produtores com o objectivo de tomar as medidas apropriadas para assegurar o exercício racional das actividades da pesca e melhorar as condições de venda da sua produção, promovendo, nomeadamente, a aplicação de planos de captura, concentração da oferta e regularização dos preços e que seja oficialmente reconhecida nos termos da legislação comunitária aplicável.

Artigo 3.º

1 – A «caldeirada», o «balde» ou o peixe atribuídos, nos termos dos instrumentos de regulamentação do trabalho, para alimentação do pescador ou para consumo próprio do armador, quando comercializados, sê-lo-ão obrigatoriamente em lota, pelo sistema referido no artigo 1.º
2 – O «quinhão» ou a «parte», quando atribuídos a título de retribuição em espécie, acessória à retribuição principal fixada em instrumento de regulamentação colectiva do trabalho, quando comercializados, ficam sujeitos à obrigação constante do número anterior.
3 – O pescado referido nos números anteriores, quando não se destinar à comercialização, só pode sair do recinto da lota acompanhado por documento emitido pela embarcação pela qual foi capturado e autorizado pela entidade que explorar a lota.
4 – O documento referido no número anterior indicará obrigatoriamente a quantidade de pescado a movimentar, a embarcação de proveniência e a que título foi atribuído, bem como a identificação do seu beneficiário.

Artigo 4.º

1 – Ficam isentos do regime fixado no artigo 1.º:
a) As capturas provenientes do exercício da pesca desportiva;
b) As capturas efectuadas nos domínios fluvial e lacustre;
c) O pescado proveniente da exploração de estabelecimentos de culturas marinhas, bem como o capturado em bancos só temporariamente submersos;
d) O pescado capturado para fins científicos.
2 – Sem prejuízo de a sua transmissão ou entrega se processar obrigatoriamente na lota correspondente ao porto de descarga, através da entidade por ela responsável, nomeadamente para efeitos do controle de quantidade e qualidade, ficam também isentos do regime fixado no artigo 1.º:
a) O pescado capturado pelas organizações de produtores ao abrigo de contratos de abastecimento com comerciantes ou industriais de produtos da pesca;
b) O pescado capturado por pessoas singulares ou colectivas, membros de organizações de produtores, que se dediquem simultaneamente à captura e transformação do pescado, desde que essa actividade seja enquadrada nas regras de comercialização e produção adoptadas pela respectiva organização de produtores, em conformidade com o estabelecido no artigo 5.º do Regulamento (CEE) n.º 2062/80 e no artigo 5.º do Regulamento (CEE) n.º 3792/81;
c) O pescado capturado por pessoas singulares ou colectivas, membros de organizações de produtores, ao abrigo de contratos de abastecimento celebrados com comerciantes ou industriais de produtos da pesca, desde que os mesmos sejam enquadrados nas regras de comercialização e produção adoptadas pela respectiva organização de produtores, em conformidade com o estabelecido no artigo 5.º do Regulamento (CEE) n.º 2062/80 e no artigo 5.º do Regulamento (CEE) n.º 3792/81.
3 – As capturas realizadas para abastecimento da indústria de farinação e óleos poderão ser descarregadas na unidade fabril transformadora, sem prejuízo de a respectiva quantidade e valor serem obrigatoriamente comunicados, por escrito, à entidade que explore as lotas, nas instalações da lota mais próxima da unidade fabril.

Artigo 5.º

1 – Serão estabelecidos por portaria conjunta dos Ministros da Agricultura, Pescas e Alimentação e da Saúde:
a) As condições técnicas e sanitárias, incluindo os requisitos relativos ao local de implantação, a que deverão obedecer a instalação e licenciamento das lotas;
b) O regulamento geral de funcionamento das lotas, contemplando, nomeadamente, os procedimentos e meios envolvidos no leilão.
2 – O licenciamento dos lotes e a fiscalização do seu funcionamento competem ao Instituto Português de Conservas e Pescado.
3 – A decisão da satisfação das condições técnicas e sanitárias da lota compete:
a) À Direcção-Geral de Pecuária e à Direcção-Geral dos Cuidados de Saúde Primários, no que se refere às condições hígio-sanitárias;
b) Ao Instituto Português de Conservas e Pescado, no que se refere às condições técnico-funcionais e de implantação.
4 – O licenciamento de novas lotas fica sujeito, sem prejuízo da satisfação das condições exigidas nos termos do n.º 1, à comprovação da sua necessidade, tendo em conta as estruturas já existentes e a necessidade de escoamento do produto.

Artigo 6.º

1 – Será obrigatoriamente emitida guia de acompanhamento a todo o pescado fresco transmitido, entregue ou transaccionado em lota.
2 – Da guia de acompanhamento referida no número anterior constará:
a) Nome e morada do detentor;
b) Qualidade em que detém o pescado;
c) Espécies;
d) Quantidade e preço;
e) Data da operação.

Artigo 7.º

1 – A intervenção no leilão referido no artigo 1.º é permitida aos produtores, organizações de produtores, armazenistas, exportadores, industriais, retalhistas, vendedores ambulantes e feirantes ou aos respectivos mandatários que exibam cartão de identificação válido.
2 – O cartão de identificação será emitido pela entidade que explorar a lota contra a demonstração, por documento autêntico, da qualidade invocada do pretendente.
3 – Poderão ainda intervir no leilão outras pessoas singulares ou colectivas, de forma permanente ou por períodos determinados, sempre que tal se justifique, por razões que se prendam, nomeadamente, com a localização da lota e com a especificidade da oferta do pescado ou da época do ano, competindo à entidade que explorar a lota submeter tais situações a autorização dos Ministros da Agricultura, Pescas e Alimentação e da Indústria e Comércio.

Artigo 8.º

1 – O pescado fresco será obrigatoriamente entregue, transaccionado ou leiloado na lota correspondente ao porto de descarga.
2 – A transferência do pescado para lota diferente da correspondente ao porto de descarga, para efeitos de ali ser transaccionado ou leiloado, será autorizada pela entidade que explorar a lota, a solicitação do produtor, devidamente justificada.
3 – O pescado cuja transferência seja autorizada ao abrigo do número anterior será acompanhado de uma guia de transferência, que indicará a data e local da descarga, a identificação do produtor, as espécies e respectivas quantidades de pescado a transferir e a lota de destino.
4 – A guia de transferência será emitida em triplicado, sendo uma das cópias entregue na lota de destino, que a devolverá à lota de origem, após a consumação da entrega, transacção ou leilão.

Artigo 9.º

1 – Para efeitos de aplicação do presente diploma, a entidade que explorar as lotas deverá assegurar:
a) A regulação da descarga do pescado;
b) A recepção, leilão e entrega do pescado;
c) O registo do pescado movimentado ao abrigo do artigo 3.º;
d) O registo das capturas descarregadas nos termos e ao abrigo do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 4.º;
e) O registo das transmissões ou entregas do pescado efectuadas nos termos e ao abrigo do disposto nos n.os 2 e 3 do artigo 4.º;
f) O registo discriminado das entregas do pescado objecto de licitação;
g) O fornecimento, nos termos e condições fixados na lei, de todas as informações sobre a movimentação do pescado;
h) As facilidades e todo o auxílio necessário ao exercício da fiscalização hígio-sanitária;
i) Toda a colaboração necessária à aplicação de normas de qualidade impostas por lei e respectivo controle de conformidade;
j) Toda a colaboração necessária à aplicação dos mecanismos de regulação de preços e mercado previstos na lei;
l) O auxílio à actividade das organizações de produtores oficialmente reconhecidas em tudo quanto se relacione com a entrega, transacção ou leilão dos seus produtos ou dos seus aderentes;
m) Toda a colaboração necessária para a boa execução das normas relativas ao abastecimento público e comercialização dos produtos da pesca que sejam impostas por lei;
n) A observância por todos os intervenientes das disposições do presente diploma, recorrendo, se necessário, às autoridades competentes.
2 – A entidade que explorar as lotas poderá executar, a título de prestação de serviços, outras operações ou tarefas prévias, complementares ou relacionadas com a recepção, leilão e entrega do pescado, nomeadamente:
a) Descarga, transporte, selecção, pesagem, conservação, congelação e armazenagem do pescado;
b) Fornecimentos e serviços de apoio à actividade de pesca.
3 – Quando devidamente mandatada, a entidade que explorar a lota assegurará o controle do fornecimento de combustíveis destinados exclusivamente à pesca, emitindo os cartões de autorização de abastecimento, quando necessários.

Artigo 10.º

Em cada porto de pesca a entidade que explorar a lota terá obrigatoriamente como órgão de apoio e consulta uma comissão consultiva, integrando produtores e compradores, cuja composição e funcionamento constarão de despacho dos Ministros da Agricultura, Pescas e Alimentação e da Indústria e Comércio.

Artigo 11.º

1 – Os preços a pagar pela prestação dos serviços referidos nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 9.º serão homologados pelo Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação, ouvidas as organizações de produtores e as comissões consultivas.
2 – Até à entrada em vigor do regulamento referido na alínea b) do n.º 1 do artigo 5.º, serão aplicáveis os regulamentos actualmente em vigor.
3 – Enquanto não forem estabelecidos os preços referidos no n.º 1, mantêm-se em vigor as taxas fixadas pelo Decreto-Lei n.º 255/77, de 16 de Junho.
4 – Os serviços inerentes à primeira venda continuarão a ser prestados pela universalidade de pessoas e bens que actualmente os assegura.

Artigo 12.º

1 – Constituem contra-ordenações os comportamentos como tal tipificados que infrinjam disposições do presente diploma e seus regulamentos.
2 – A tentativa é punível nos termos legais.

Artigo 13.º

Constituem contra-ordenações puníveis com coima de 5000$00 a 500000$00 as seguintes infracções:
a) Transaccionar pescado fresco em primeira venda ou, por qualquer outra forma, movimentá-lo fora das lotas antes de ter sido sujeito à primeira venda em lota;
b) Transaccionar ou, por qualquer outra forma, movimentar pescado fresco em lota que não seja a correspondente ao porto de descarga, quando para tanto não esteja autorizado ao abrigo do n.º 2 do artigo 8.º;
c) A falta de comunicação ou a comunicação viciada dos elementos à entidade e no local previstos no artigo 3.º e no n.º 2 do artigo 4.º do presente diploma;
d) Transportar para fora da lota o pescado correspondente à «caldeirada», «balde» ou peixe para alimentação do pescador, o pescado destinado ao consumo próprio do armador e o «quinhão» ou a «parte» atribuídos nos termos do n.º 2 do artigo 3.º quando não tenham sido comercializados, sem se fazerem acompanhar pelo documento referido no n.º 3 do mesmo artigo;
e) A movimentação do pescado fresco transmitido, entregue ou transaccionado em lota sem se fazer acompanhar pela guia exigida no n.º 1 do artigo 6.º;
f) A transferência do pescado para lota diferente da correspondente ao porto de descarga, quando devidamente autorizada, sem se fazer acompanhar da guia de transferência exigida pelo n.º 3 do artigo 8.º

Artigo 14.º

O produto das coimas aplicadas pelas contra-ordenações previstas neste diploma reverterá integralmente para o Estado.

Artigo 15.º

Em função da gravidade da contra-ordenação e da situação económica do agente, poderão ser aplicadas as seguintes sanções acessórias:
a) Perda, a favor do Estado, do pescado objecto de transacção ou movimentação que preencha o tipo legal da contra-ordenação;
b) Interdição do exercício da pesca durante o prazo máximo de dois anos;
c) Suspensão do direito à candidatura a subsídios a conceder pelo Estado Português pelo período máximo de dois anos.

Artigo 16.º

1 – A aplicação das coimas e sanções acessórias previstas no presente diploma compete ao inspector-geral das Pescas, salvo as que respeitem às alíneas e) e f) do artigo 13.º, que serão da competência da Comissão de Aplicação de Coimas, a que se refere o n.º 2 do artigo 52.º do Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de Janeiro.
2 – A Inspecção-Geral das Pescas enviará cópias das decisões que proferir ao abrigo do n.º 1 ao Instituto Português de Conservas e Pescado.

Artigo 17.º

1 – A investigação e a instrução dos processos pelas contra-ordenações previstas no presente diploma competem aos serviços dos Ministérios das Finanças, da Agricultura, Pescas e Alimentação e da Indústria e Comércio, no âmbito das atribuições e competências que lhes estejam legalmente conferidas relativamente a inspecção, vigilância e polícia, os quais, uma vez instruídos, serão remetidos à entidade competente para a aplicação das sanções referidas no artigo 16.º
2 – Os autos de notícia dos agentes dos órgãos e serviços referidos no número anterior por infracções que tenham presenciado fazem fé em juízo, nos termos previstos na legislação processual penal.

Artigo 18.º

1 – O recurso de impugnação das decisões da entidade competente para aplicar as sanções previstas neste diploma será interposto para o tribunal competente.
2 – O tribunal competente pedirá oficiosamente o cadastro dos recorrentes à Inspecção-Geral das Pescas antes da apreciação do recurso, se os autos ainda não o contiverem.
3 – O tribunal enviará cópias das suas decisões à Inspecção-Geral das Pescas.

Artigo 19.º

Em tudo quanto não estiver contemplado no presente diploma aplicar-se-á o regime geral das contra-ordenações, constante do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro.

Artigo 20.º

A aplicação do disposto no presente diploma às regiões autónomas será feita com as devidas adaptações.

Artigo 21.º

É revogado o Decreto-Lei n.º 147/79, de 24 de Maio.

Artigo 22.º

O presente diploma entra em vigor 30 dias após à data da sua publicação.

Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 9 de Junho de 1987. – Aníbal António Cavaco Silva – Manuel Carlos Carvalho Fernandes – Jorge Manuel de Oliveira Godinho – Mário Ferreira Bastos Raposo – Fernando Augusto dos Santos Martins – António Luís Mendes Baptista Pereira.

Promulgado em 21 de Julho de 1987.

Publique-se.

O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 24 de Julho de 1987.
Pelo Primeiro-Ministro, Eurico Silva Teixeira de Melo, Ministro de Estado.

Veja também

Portaria n.º 774/2009, de 21 de Julho

Altera o Regulamento da Pesca por Arte de Armadilha, aprovado pela Portaria n.º 1102-D/2000, de 22 de Novembro