Decreto-Lei n.º 393-B/98, de 4 de Dezembro

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Decreto-Lei n.º 393-B/98

PÁGINAS DO DR : 6708-(52) a 6708-(55)

A adopção de medidas de protecção respeitantes à encefalopatia espongiforme dos bovinos (EEB) em 1994 levou à interdição da utilização de proteínas derivadas de tecidos de mamíferos na alimentação dos ruminantes. Estas medidas visaram reduzir o risco de infecção de EEB nos ruminantes nascidos a partir daquela data.
Contudo, a suspeita de contaminação cruzada da alimentação de ruminantes a partir de alimentos compostos destinados a outras espécies (suínos e aves) que incorporam legalmente farinha de carne, farinha de ossos, farinha de carne e ossos, farinha de sangue e gorduras animais tornou necessária a implementação de acções complementares com o objectivo fundamental de excluir a infecciosidade da EEB na alimentação dos ruminantes.
Nesta perspectiva, é criada legislação no sentido de proibir a utilização na alimentação animal de proteínas obtidas a partir de tecidos de mamíferos, bem como a recolha e destruição destes produtos e dos alimentos compostos que os incorporam nas unidades de fabrico, revendedores e explorações agro-pecuárias.
Admite-se, porém, a utilização de gorduras na alimentação animal, excepto em ruminantes, desde que respeitadas as adequadas condições técnicas de produção.

Assim:
O Governo, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, decreta o seguinte:

Artigo 1.º
Âmbito

O presente diploma adopta medidas complementares de luta contra a encefalopatia espongiforme bovina no domínio da alimentação animal, aplicáveis no território de Portugal continental.

Artigo 2.º
Definições

Para efeitos do presente diploma, entende-se por:
a) Animais de exploração – os animais domésticos das espécies bovina, suína, ovina e caprina, os solípedes, as aves de capoeira e os coelhos domésticos, bem como os animais selvagens das espécies atrás referidas e os ruminantes selvagens, desde que tenham sido criados numa exploração;
b) Produtos da aquicultura – todos os produtos da pesca cujo nascimento e crescimento são controlados pelo homem até à sua colocação no mercado como género alimentício; todavia, os peixes ou crustáceos de água do mar ou de água doce capturados quando juvenis ou no seu meio natural e mantidos em cativeiro até atingirem o tamanho comercial pretendido para consumo humano são também considerados produtos da aquicultura; os peixes e crustáceos de tamanho comercial capturados no seu meio natural e mantidos vivos para serem vendidos posteriormente não são considerados produtos da aquicultura se a sua permanência nos viveiros tiver como único objectivo mantê-los vivos e não fazê-los aumentar de tamanho ou de peso;
c) Alimentos para animais – os produtos de origem vegetal ou animal no estado natural, frescos ou conservados, e os derivados da sua transformação industrial, bem como as substâncias orgânicas ou inorgânicas, simples ou em misturas, contendo ou não aditivos destinados à alimentação animal por via oral;
d) Alimentos compostos para animais – misturas de matérias-primas para alimentação animal, com ou sem aditivos, destinadas à alimentação animal por via oral, quer como alimentos completos quer como alimentos complementares;
e) Matérias-primas para alimentação animal – os diversos produtos de origem vegetal ou animal, no seu estado natural, frescos ou conservados, bem como os produtos derivados da sua transformação industrial, e as substâncias orgânicas ou inorgânicas, com ou sem aditivos, destinadas a ser utilizadas na alimentação animal por via oral, quer directamente, sem transformação, quer, após transformação, na preparação de alimentos compostos para animais ou como suporte de pré-misturas;
f) Farinha de carne – produto obtido por aquecimento, secagem e trituração da totalidade ou de partes de animais terrestres de sangue quente, dos quais a gordura pode ter sido parcialmente extraída ou retirada por processos físicos. Deve ser praticamente isento de cascos, cornos, cerdas, pêlos e penas e do conteúdo do tracto digestivo.
Teor mínimo da proteína bruta: 50% em relação à matéria seca.
Teor máximo de fósforo total: 8%;
g) Farinha de carne e osso – produto obtido por aquecimento, secagem e trituração da totalidade ou de partes de animais terrestres de sangue quente, dos quais a gordura pode ter sido parcialmente extraída ou retirada por processos físicos; o produto deve ser praticamente isento de cascos, cornos, cerdas, pêlos e penas e do conteúdo do tracto digestivo;
h) Farinha de ossos – produto obtido por secagem, aquecimento e trituração fina de ossos de animais terrestres de sangue quente, dos quais grande parte da gordura foi extraída ou separada por processos físicos. Deve estar praticamente isento de cascos, cornos, cerdas, pêlos e penas e do conteúdo do tracto digestivo;
i) Farinha de sangue – produto obtido por secagem de sangue de animais de sangue quente abatidos. Deve estar praticamente isento de substâncias estranhas;
j) Farinha de aves de capoeira – produto obtido por aquecimento, secagem e trituração de subprodutos do abate de aves de capoeira. Deve estar praticamente isento de penas;
l) Gorduras animais – produto constituído por gordura de animais terrestres de sangue quente;
m) Produto – o alimento para animais ou qualquer substância utilizada na sua alimentação;
n) Animal de companhia – qualquer animal detido ou destinado a ser detido pelo homem, designadamente em sua casa para seu entretenimento e enquanto companhia.

Artigo 3.º
Interdições

1 – É interdita a utilização na alimentação de animais de exploração e na aquicultura, por qualquer forma, de farinhas de carne, farinhas de ossos, farinhas de carne e ossos e farinhas de sangue e gorduras obtidas a partir de tecidos de mamíferos, seja qual for a sua origem e proveniência.
2 – É interdita a utilização na alimentação de ruminantes de farinha de aves de capoeira.
3 – São igualmente interditas a detenção, a armazenagem e a comercialização das matérias-primas referidas no n.º 1, seja qual for a sua origem ou proveniência, excepto quando se encontrem sob controlo das autoridades sanitárias ou policiais com vista à sua destruição.
4 – Excluem-se das interdições previstas nos n.os 1 e 3, sem prejuízo do disposto no Decreto-Lei n.º 377/98, de 25 de Novembro, sobre a eliminação e destruição obrigatória dos materiais de risco específico, a gordura fundida de suíno, bem como outras gorduras de origem animal produzidas de acordo com as condições definidas no anexo ao presente diploma e destinadas exclusivamente à alimentação de animais não ruminantes.
5 – O disposto nos n.os 1, 2 e 3 não é aplicável à alimentação de animais de companhia.

Artigo 4.º
Destruição

1 – As matérias-primas referidas no presente diploma são obrigatoriamente destruídas por incineração, sem prejuízo da destruição por qualquer outra forma que venha a ser considerada cientificamente apropriada de acordo com as melhores práticas internacionais e as normas em vigor de eliminação de resíduos.
2 – Sem embargo de a responsabilidade pelas operações de destruição referidas no número anterior ser do detentor das matérias-primas em causa, o Estado assumirá, com carácter excepcional e temporariamente, os encargos inerentes às mesmas, nos termos definidos no n.º 2 do artigo 6.º
3 – Mediante portaria dos Ministros das Finanças e da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, o Governo poderá fixar taxas a suportar pelos estabelecimentos de abate e destinadas ao financiamento das operações inerentes aos serviços prestados com vista à destruição das matérias-primas referidas no n.º 1.

Artigo 5.º
Destruição de existências

1 – As existências das farinhas e gorduras referidas no n.º 1 do artigo 3.º, bem como as existências de alimentos compostos para animais com incorporação daquelas farinhas e gorduras, que à data da entrada em vigor do presente diploma sejam detidas pelas unidades de transformação de subprodutos de origem animal, pelas fábricas de alimentos compostos para animais, pelos revendedores e pelas explorações agrícolas são obrigatoriamente sujeitas ao processo de destruição por incineração.
2 – Para execução do disposto no número anterior, a Direcção-Geral de Veterinária (DGV), em cooperação com a Inspecção-Geral das Actividades Económicas (IGAE), promoverá a selagem dos produtos referidos naquela disposição, solicitando para o efeito a intervenção de quaisquer autoridades administrativas e policiais, nomeadamente das direcções regionais de agricultura (DRA) e da Direcção-Geral da Fiscalização e Controlo da Qualidade Alimentar (DGFCQA).
3 – Os produtos selados nos termos do número anterior ficarão sob controlo das autoridades até à sua destruição, por incineração, devendo estas designar um fiel depositário para as mesmas.
4 – Os proprietários dos produtos selados nos termos do n.º 2 são indemnizados pelo preço dos mesmos à saída da fábrica, nas condições definidas em despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas.

Artigo 6.º
Pagamentos

1 – Compete ao Instituto Nacional de Intervenção e Garantia Agrícola (INGA) proceder ao pagamento das indemnizações a que se refere o n.º 4 do artigo anterior, à contratação das entidades que se encarregarão da destruição dos produtos em causa e ao custeio dos encargos inerentes à mesma.
2 – Compete igualmente ao INGA contratar e custear as operações de recolha, transformação e destruição das matérias-primas referidas no n.º 1 do artigo 4.º, nos termos definidos em despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas.
3 – O financiamento das operações a que se referem os números anteriores será suportado por verbas do Orçamento do Estado e de outras receitas do INGA.

Artigo 7.º
Manifesto de existências

1 – Os detentores das farinhas e gorduras referidas no n.º 1 do artigo 5.º, bem como de alimentos compostos que as incorporem, são obrigados a apresentar, no prazo de 10 dias úteis a contar da data de entrada em vigor do presente diploma, declaração dos produtos em seu poder.
2 – A declaração a que se refere o número anterior é apresentada na DGV ou nas DRA da área de domicílio do declarante, conforme modelos aprovados pela DGV.
3 – As declarações entregues nas DRA serão enviadas por estas à DGV, no prazo de cinco dias úteis, para determinação da quantificação dos produtos e posterior remessa do processo ao INGA para efeitos do disposto no artigo 6.º

Artigo 8.º
Fiscalização

Sem prejuízo da competência atribuída por lei a outras entidades, a fiscalização do disposto no presente diploma compete especialmente à DGV, à DGFCQA, às DRA e à IGAE, no âmbito das respectivas competências.

Artigo 9.º
Contra-ordenações

1 – Sem prejuízo do procedimento criminal eventualmente aplicável em cada caso concreto, ao abrigo da legislação penal sobre crimes de perigo, quem, pela sua conduta, violar o disposto no artigo 3.º do presente diploma, obstar de qualquer modo à concretização do disposto no artigo 5.º ou não cumprir o determinado no artigo 7.º é punido com coima de 500000$00 até 750000$00 ou até 9000000$00, consoante o agente seja pessoa singular ou colectiva.
2 – A negligência e a tentativa são puníveis.

Artigo 10.º
Sanções acessórias

1 – Cumulativamente com as coimas previstas no presente diploma, podem ser aplicadas as seguintes sanções acessórias, em função da gravidade da infracção e da culpa do agente:
a) Interdição do exercício da actividade cujo exercício dependa de título público ou de autorização ou de homologação de autoridade pública;
b) Encerramento do estabelecimento onde a actividade se exerce cujo funcionamento esteja sujeito a autorização ou licença de autoridade administrativa;
c) Suspensão das autorizações, licenças ou alvarás.
2 – As sanções acessórias referidas no número anterior terão a duração máxima de dois anos, contados a partir do trânsito em julgado da decisão condenatória.

Artigo 11.º
Processo

1 – Às contra-ordenações previstas neste diploma aplica-se subsidiariamente o disposto no Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, com a redacção dada pelos Decretos-Lei n.os 356/89, de 17 de Outubro, e 244/95, de 14 de Setembro.
2 – Sem prejuízo da competência atribuída por lei a outras entidades, a instrução dos processos compete à DGV, à DGFCQA, às DRA e à IGAE, em conformidade com a respectiva competência fiscalizadora.
3 – Compete ao director-geral de Veterinária a aplicação das coimas e sanções acessórias previstas no presente diploma.
4 – O produto das coimas constitui receita das seguintes entidades:
a) 20% para a entidade fiscalizadora que levantar os autos e proceder à instrução;
b) 20% para a Direcção-Geral de Veterinária;
c) 60% para os cofres do Estado.

Artigo 12.º
Disposição final

As medidas previstas no presente diploma poderão ser revistas logo que a evolução da EEB em Portugal o aconselhe.

Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 5 de Novembro de 1998. – António Manuel de Oliveira Guterres – António Luciano Pacheco de Sousa Franco – Joaquim Augusto Nunes de Pina Moura – Luís Manuel Capoulas Santos.

Promulgado em 25 de Novembro de 1998.

Publique-se.

O Presidente da República, JORGE SAMPAIO.
Referendado em 3 de Dezembro de 1998.
O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres.

ANEXO

1 – As gorduras a que se refere o disposto no n.º 4 do artigo 3.º só podem ser utilizadas na alimentação animal desde que produzidas nas seguintes condições mínimas, previstas nos capítulos I, II, III, IV, VI e VII do anexo da Decisão n.º 92/562/CEE:
a) Tratamento em descontínuo/pressão atmosférica/gordura natural:
Dimensão mínima das partículas: 150 mm;
Temperatura: >100ºC, >110ºC e >120ºC;
Tempo: 125 min., 120 min. e 50 min.;
b) Tratamento em descontínuo/sob pressão/gordura natural:
Dimensão máxima das partículas: 50 mm;
Temperatura: >100ºC e >133ºC;
Tempo: 25 min. e 20 min.;
Pressão (absoluta): 3 bar;
c) Tratamento em contínuo/pressão atmosférica/ gordura natural:
Dimensão máxima das partículas: 30 mm;
Temperatura: >100ºC, >110ºC e 120ºC;
Tempo: 95 min., 55 min. e 13 min.;
d) Tratamento em contínuo/pressão atmosférica/ gordura adicionada e tratamento em contínuo/ sob pressão/gordura adicionada:
Dimensão máxima das partículas: 30 mm;
Temperatura: >100ºC, >110ºC, 120ºC e 130ºC;
Tempo: 16 min., 13 min., 8 min. e 3 min.;
e) Tratamento em contínuo/pressão atmosférica/ desengorduramento:
Dimensão máxima das partículas: 20 mm;
Temperatura: >80ºC e >100ºC;
Tempo: 120 min. e 60 min.

2 – As gorduras referidas no número anterior devem ser filtradas após terem sido produzidas.

3 – A produção das gorduras a que se refere o n.º 1 tem de processar-se em linha de produção exclusivamente destinada a esse efeito.

Veja também

Norma NP 1107

Norma NP 1107, Comissão Técnica C 350 /CT 35, ano 1985, Referente a Carnes, derivados e produtos cárneos. Bife-de-hamburgo de bovino. Definição, características e acondicionamento