Banco para internacionalização pode apoiar agro-alimentar

O diagnóstico está traçado: o agro-alimentar está a organizar-se e a crescer, no mercado doméstico e no volume de vendas para o exterior. E já logrou entrar na agenda política nacional, pese embora o “momento crítico” que hoje vive, dada a situação económica e financeira do país e o estado das economias para onde Portugal tradicionalmente exporta.

E se o quadro fiscal, a atomização e o acesso às matérias-primas condiciona as empresas do sector, é o acesso ao crédito bancário que mais preocupa os empresários. Certo é que “a banca não pode fazer milagres”, diz Basílio Horta prontamente, mas o presidente da AICEP aponta alternativas a partir do BPN: é preciso criar um banco de fomento para apoiar a internacionalização da economia. Todos ganhariam: o agro-alimentar e os restantes sectores que dele precisem.

“Estamos num momento especialmente crítico, face à situação económica com que o país se debate e a das economias para onde Portugal tradicionalmente exporta”. O diagnóstico inicial parte de Jorge Henriques, ao iniciar o pequeno-almoço/debate sobre o “Sector agro-alimentar: que perspectivas para o crescimento, a inovação e a internacionalização?”.
O presidente da Federação das Indústrias Portuguesas Agro-Alimentares (FIPA) lamentou que o sector não tenha entrado na agenda política nos últimos anos, tido que era como “marginal na economia portuguesa”. Certo é que isso tende a mudar, pese embora “um dos maiores constrangimentos”: o acesso às matérias-primas, com necessidade de “recorrer aos mercados externos para se aprovisionar”, dada a ausência de “uma política de fileira” que premeie as produções nacionais.

A par de tudo isto, também o quadro fiscal condiciona as empresas do sector, sobretudo “quando queremos competir no mercado ibérico com os vizinhos espanhóis”. Quer no âmbito do IVA, agravado em 2011, quer do IRC e noutras políticas fiscais estamos, diz Jorge Henriques, “completamente desenquadrados do espaço ibérico”.

E apesar de, “nos últimos anos”, os apoios às exportações se começarem a “sentir”, muito por responsabilidade da AICEP – “uma nova ferramenta de apoio, que está a dar os primeiros passos e os primeiros frutos” -, o presidente da FIPA, como, de resto, todos os intervenientes no debate convergem num só e único sentido – “um dos grandes constrangimentos que a indústria em geral e a do agro-alimentar tem, neste momento, é o acesso ao crédito bancário”.
“Houve muita gente do agro-alimentar que concorreu ao PRODER, mas os investimentos não se fazem apenas com o PRODER”, avisou Jorge Henriques no debate. Fazem-se também “com recurso ao crédito e, uma parte, com capitais próprios”.

O problema é que “estamos a importar oito mil milhões de euros” de produtos, o que é “um peso muito grande para a economia”, sendo que “sessenta e tal por cento das importações vêm de Espanha”, acrescentou Basílio Horta. E se é verdade que tem havido “um esforço grande nos últimos tempos”, “é preciso fazer mais”. Desde logo na “organização dos sectores”, onde constata, ainda assim, haver progressos “relevantes”, nos vinhos, nas frutas, no azeite e no tomate para a indústria.

O grande problema do agro-alimentar em Portugal está, porém, por ultrapassar. E no debate Basílio Horta questionou quem estava à mesa: “o que é que é decisivo quando falamos de internacionalização?”. A resposta, pronta, surgiu pela mesma voz: “o decisivo é uma coisa muito simples chamada crédito, pois se não há um mínimo de capacidade de garantir um financiamento à economia minimamente viável, bom, então temos um problema”. E, aí, Basílio Horta duvida “se estamos a fazer o melhor”, dadas “as dificuldades de financiamento que os bancos têm”.

Como também frisou Mira Amaral, “o país deixou de ter poupança doméstica para financiar os investimentos, pois desde que entrámos no euro que houve este ‘boom’ de consumo e de diminuição da poupança passou-se a recorrer aos mercados externos”. A verdade é que “enquanto a primeira fase do euro funcionou bem, foi extremamente fácil, a banca fazia as análises de risco e não havia problema nenhum, mas a partir do momento em que os mercados passaram a desconfiar de Portugal, fecharam-se e a banca portuguesa está a recorrer a financiamentos de curto prazo para financiar a economia”.

Ciente destas limitações dos bancos nacionais, Basílio Horta aconselha “reflexão”. E lança o repto ao Governo da República: “por que é que não criamos um banco de fomento para a internacionalização?”, a exemplo do passado com o Banco de Fomento e Exterior. “Temos várias capitais de risco públicas, várias linhas de crédito, temos seis mil milhões em linhas de crédito e até temos o BPN que, se mudasse de nome e fosse posto com uma estrutura decente, podia ser uma coisa interessante, ligado à CGD ou com participação dos bancos”. A concretizar-se, podia aqui “fazer-se qualquer coisa destinado à internacionalização da economia, apoiando o agro-alimentar e os outros que precisam”.

Preocupado com o agro-alimentar, o presidente da AICEP é claro na mensagem: “a Agência está a dar e quer dar cada vez mais ao sector”, sendo prova disso a “articulação bastante estreita” com o Ministério da Agricultura, onde a Agência tem já um seu representante. E “também temos uma ligação ao ‘Portugal Foods’ que é outra marca importante no sector”, referiu Basílio Horta. Focou até que, “talvez no futuro, possamos ter um representante junto do Pólo, no sentido de articular iniciativas que aquele desenvolve no estrangeiro, dando-lhe coerência e maior capacidade de intervenção”.

Uma ideia que agrada a João Miranda, que preside há ano e meio à estrutura financiada pelo COMPETE e por meios próprios das cerca de 70 entidades que agrega, e de cujo trabalho faz “um balanço extremamente positivo”. Acima de tudo, diz o presidente do ‘Portugal Foods’, “conseguimos chamar a atenção de que existe o sector agro-alimentar e alertámos para a necessidade de haver um diálogo muito mais intenso entre os ministérios da Agricultura e da Economia”. De uma coisa está certo João Miranda: “este é um momento de avaliação” e “nós, Pólo, precisamos de dimensão crítica”. É, pois, preciso “ponderar” se faz sentido “fazer fusões”, dado que, no agro-industrial, há “um pólo [nacional] e dois clusters [regionais]”. E há, ao mesmo tempo, “uma zona crítica que não está a ser trabalhada”: o sector primário (agricultura e pescas) que, esse sim, “merece um pólo de competitividade”.

“Portugal Foods” e AEP em parceria no SIAL do Canadá
Sendo uma das suas áreas de estudo os mercados, o Pólo ‘Portugal Foods’ está hoje em parceria com a AEP para “agregar as empresas”, sendo que a primeira das iniciativas comuns é a participação conjunta na próxima feira SIAL do Canadá (Toronto), em Maio próximo. “O único objectivo é captar empresas e fazer com que participem de forma o mais disciplinada possível e diferenciá-las positivamente”, refere João Miranda, frisando que “nós não queremos que empresas que não têm capacidades para estarem nos mercados externos que, pelo facto de terem apoio, vão fazer esta incursão”. Isso “estraga a imagem de Portugal”.

Daí que o “Portugal Foods” pretenda, como marca chapéu, “representar as melhores empresas, as que já têm competências internalizadas nas suas próprias organizações para poderem responder aos desafios da internacionalização”, esclarece João Miranda. Helena Ramos explica, por seu lado, que “a AEP tem uma vantagem: é aglutinadora de fileiras”, trabalhando, “na selectividade dos mercados” e apoiando financeiramente, através do COMPETE, em 40% ou 45% “dependendo se é pequena e média ou grande empresa”.

Questionada sobre a recente parceria com o ‘Portugal Foods’, não hesita: “é muito importante, porque nos vai fazer aparecer com uma marca chapéu e uma imagem comum de Portugal”. O país, diz, “precisa de aparecer com força e maior visibilidade, porque sabemos o impacto que isso cria nos mercados”.
Os intervenientes

NELSON DE SOUZA, Gestor do Programa COMPETE: “Não quero antecipar um processo de avaliação, mas temos tido dinâmicas melhores nos pólos e clusters dominados em matéria de governação por empresas directamente. A verdade é que a nossa estratégia não obriga a apoiar tudo e todos. A estratégia implica escolhas”, avisa Nelson de Souza.

LUÍS MIRA AMARAL, Presidente do Banco BIC Português e ex-ministro da Indústria: “É preciso estabilizar as finanças públicas, fazer uma execução orçamental à prova de bala para que os mercados externos se abram à banca portuguesa, porque se não se abrirem e se acabarem os financiamentos do BCE a situação fica mais grave do que está hoje em dia”, frisa Mira Amaral.

JORGE TOMÁS HENRIQUES, Presidente da Mineraqua e da FIPA: “Houve muita gente do agro-alimentar que concorreu ao PRODER. Mas os investimentos não se fazem apenas com o PRODER, mas com recurso ao crédito e com capitais próprios. E as barreiras impostas pelo crédito são um constrangimento e vão colocar em risco muitas empresas”, lembra Jorge Henriques.

JOÃO MIRANDA, Presidente da Frulact e do Pólo “Portugal Foods”: “Há um pólo nacional que é agro-industrial e dois clusters regionais agro-industriais também. Esta duplicação não faz sentido. Faz sentido é olhar para a cadeia e ver uma zona crítica que não está a ser trabalhada, que é o sector primário. E esse sector merece um pólo de competitividade.

HELENA RAMOS, Directora da AEP (Internacionalização): “Na AEP somos catalisadores, chamamos as empresas e tentamos envolvê-las. E a parceria com o pólo “Portugal Foods” é muito importante porque nos vai fazer aparecer com uma marca chapéu e uma imagem comum de Portugal. E nós sabemos o impacto que isso cria nos mercados”, explica Helena Ramos.

BASÍLIO HORTA, Presidente da AICEP: “Se não há um mínimo de capacidade de garantir um financiamento à economia minimamente viável para estas iniciativas que se estão a tomar tenham fôlego, bom, então aí temos um problema. Alías, tenho dúvidas se estamos a fazer o nosso melhor”, questiona Basílio Horta.

Fonte: Anil

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