Decreto-Lei n.º 192/89, de 8 de Junho

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Decreto-Lei n.º 192/89

PÁGINAS DO DR : 2254 a 2256

A utilização de aditivos nos géneros alimentícios tem vindo a ocupar um lugar cada vez mais importante na indústria agro-alimentar.
Com efeito, por razões de vária ordem, designadamente resultantes do aumento demográfico mundial e da evolução dos processos tecnológicos, os produtos deixaram de ser consumidos apenas em natureza para serem consumidos e transformados em larga escala. Para isso houve necessidade de adicionar aos géneros alimentares certas substâncias – os aditivos -, que os sofisticados processos industriais cada vez mais impõem, seja na fase de obtenção, tratamento, acondicionamento, transporte ou armazenagem.
Porém, se é certo que a utilização destas substâncias se tornou muitas vezes indispensável, não pode esquecer-se que a sua inclusão nos géneros alimentícios deve ser determinada por rigorosos critérios científicos e tecnológicos.
Assim, não só a Organização Mundial de Saúde (OMS) estabeleceu princípios e regras respeitantes a esta matéria, como a Comunidade Económica Europeia adoptou já directivas em relação aos quatro principais grupos de aditivos – corantes, conservantes, antioxidantes e espessantes, gelificantes ou estabilizadores do equilíbrio físico -, encontrando-se em elaboração propostas referentes às restantes classes de aditivos.
Impõe-se, pois, no plano interno, a adopção de um diploma que, contemplando os princípios estabelecidos pela OMS e transpondo as directivas comunitárias, abranja também os domínios ainda não regulados pela CEE, tomando em consideração as tradições e os hábitos alimentares nacionais e assegurando a defesa da saúde dos consumidores.
O presente diploma vem assim estabelecer os princípios orientadores da aplicação de aditivos nos géneros alimentícios e definir as regras a que deve obedecer a sua utilização.
Para além disso, atendendo ao carácter mutável desta matéria, resultante da evolução dos conhecimentos técnico-científicos, do eventual aparecimento de novos aditivos e da previsível necessidade de harmonização comunitária, prevê-se também a criação de mecanismos que permitam a adaptação do regime agora estabelecido à evolução desta realidade.
Com o fim de melhor prosseguir os objectivos visados, prevê-se ainda a criação de um órgão consultivo – a Comissão de Avaliação Toxicológica dos Aditivos Alimentares -, que terá, entre outras, a função de se pronunciar sobre as doses diárias admissíveis e a aceitação ou exclusão de novos aditivos alimentares.

Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:

Artigo 1.º

1 – O presente diploma fixa os princípios gerais orientadores da utilização dos aditivos alimentares nos géneros alimentícios, define as regras a que deve obedecer a sua aplicação e estabelece disposições relativas à sua avaliação toxicológica.
2 – Para efeitos deste diploma, não são considerados aditivos alimentares os auxiliares tecnológicos, bem como as vitaminas, sais minerais e outros nutrientes, vulgarmente adicionados aos géneros alimentícios com a finalidade de lhes melhorar as propriedades nutritivas.

Artigo 2.º

Para efeitos deste diploma entende-se por:
a) Género alimentício – toda a substância, seja ou não tratada, destinada à alimentação humana, englobando as bebidas e os produtos do tipo das pastilhas elásticas, com todos os ingredientes utilizados no seu fabrico, preparação e tratamento;
b) Aditivo alimentar – toda a substância, tenha ou não valor nutritivo, que por si só não é normalmente género alimentício nem ingrediente característico de um género alimentício, mas cuja adição intencional, com finalidade tecnológica ou organoléptica, em qualquer fase de obtenção, tratamento, acondicionamento, transporte ou armazenagem de um género alimentício, tem como consequência quer a sua incorporação nele ou a presença de um derivado, quer a modificação de características desse género;
c) Auxiliar tecnológico – toda a substância utilizada intencionalmente para desempenhar uma dada função tecnológica durante a obtenção, tratamento ou transformação de matérias-primas, géneros alimentícios ou seus ingredientes e que pode ocasionar a presença involuntária, mas inevitável, de resíduos ou de seus derivados no produto acabado.

Artigo 3.º

1 – A utilização dos aditivos alimentares nos géneros alimentícios deve obedecer aos seguintes princípios:
a) Não acarretar perigo para a saúde do consumidor, na dose ministrada;
b) Não provocar diminuição do valor nutritivo dos géneros alimentícios;
c) Não dissimular os efeitos da utilização de matérias-primas defeituosas ou de técnicas incorrectas de preparação, fabrico, tratamento, acondicionamento, transporte ou armazenagem;
d) Não induzir o consumidor em erro quanto à natureza, genuinidade ou qualidade do produto;
e) Não ser possível obter o efeito desejado por outros métodos inócuos, económica e tecnologicamente exequíveis.
2 – A par da observância dos princípios enunciados, a utilização de aditivos alimentares nos géneros alimentícios só se justifica quando corresponder a quaisquer dos seguintes objectivos:
a) Ser a utilização do aditivo tecnologicamente necessária e trazer ao consumidor vantagens demonstráveis;
b) Conservar as propriedades nutritivas dos géneros alimentícios, salvo se o aditivo for necessário para a produção de alimentos destinados a grupos de consumidores que tenham necessidades nutritivas especiais;
c) Melhorar as qualidades de conservação ou de estabilidade;
d) Aumentar a apetência do consumidor;
e) Fornecer os ingredientes necessários a géneros alimentícios destinados a grupos de consumidores que tenham necessidades nutritivas especiais.

Artigo 4.º

1 – Os aditivos alimentares admissíveis nos géneros alimentícios, os respectivos critérios de pureza e as condições da sua utilização constarão de portaria conjunta dos Ministros do Planeamento e da Administração do Território, da Agricultura, Pescas e Alimentação e da Saúde, sob proposta do Instituto de Qualidade Alimentar (IQA).
2 – A admissão de outros aditivos alimentares ou a alteração das condições de utilização fixadas nos termos do número anterior será requerida ao IQA pela entidade interessada.
3 – Os requisitos a observar na apresentação do requerimento referido no número anterior e na sua apreciação, a efectuar pelo IQA, constarão de regulamentação a aprovar por portaria conjunta dos Ministros do Planeamento e da Administração do Território, da Agricultura, Pescas e Alimentação e da Saúde.
4 – Exceptuam-se do disposto no n.º 1 os aditivos alimentares utilizados nos géneros alimentícios destinados à exportação, desde que estes satisfaçam as exigências dos países a que se destinam.

Artigo 5.º

1 – É criada a Comissão de Avaliação Toxicológica dos Aditivos Alimentares (CATA), a qual tem competência consultiva e é constituída pelos seguintes membros, a designar por despacho dos respectivos ministros da tutela:
a) O representante de Portugal no Comité Científico de Alimentação Humana, da Comissão das Comunidades Europeias;
b) Um representante do Instituto Nacional de Defesa do Consumidor;
c) Um representante do IQA;
d) Um representante da Direcção-Geral dos Assuntos Farmacêuticos;
e) Um representante da Direcção-Geral dos Cuidados de Saúde Primários;
f) Um representante das faculdades de medicina;
g) Um representante das faculdades de farmácia;
h) Um representante do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge;
i) Um especialista na matéria de reconhecida competência, sob proposta do IQA.
2 – A CATA é presidida pelo representante de Portugal no Comité Científico de Alimentação Humana, da Comissão das Comunidades Europeias, e funcionará junto do IQA, que assegurará o respectivo secretariado e o apoio técnico e administrativo.

Artigo 6.º

São competências da CATA:
a) Proceder à avaliação toxicológica dos aditivos, incluindo o estabelecimento das respectivas doses diárias admissíveis;
b) A pedido do IQA, dar parecer, de carácter vinculativo quando desfavorável, sobre a admissão de aditivos alimentares não previstos no n.º 1 do artigo 4.º nem em legislação comunitária, respectivos graus de pureza e condições de utilização;
c) Pronunciar-se, a pedido de qualquer dos seus membros ou do Instituto Nacional de Defesa do Consumidor, sobre os aditivos alimentares já admitidos, respectivos graus de pureza e condições de utilização, assegurando a sua reavaliação;
d) Propor ao IQA a exclusão de aditivos alimentares já admitidos, sempre que a evolução dos conhecimentos técnicos e científicos o justifique.

Artigo 7.º

1 – A CATA elaborará o seu regulamento interno no prazo de 60 dias após a sua constituição.
2 – Os membros da CATA são obrigados, mesmo após a cessação das funções, a não divulgar as informações que, pela sua natureza, estejam abrangidas pelo segredo profissional.
3 – No regulamento referido no n.º 1 deverão ser estabelecidas as matérias abrangidas pelo segredo profissional.

Artigo 8.º

São aplicáveis as disposições dos artigos 24.º, 58.º e 64.º do Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de Janeiro.

Artigo 9.º

São revogáveis os seguintes diplomas:
a) Decreto n.º 35815, de 19 de Agosto de 1946;
b) Decreto-Lei n.º 40520, de 2 de Fevereiro de 1956;
c) Despacho de 2 de Junho de 1964, publicado em 11 de Junho de 1964;
d) Portaria n.º 21168, de 16 de Março de 1965;
e) Despacho de 7 de Junho de 1966, publicado em 24 de Junho de 1966;
f) Portaria n.º 23490, de 18 de Julho de 1968;
g) Portaria n.º 159/70, de 24 de Março;
h) Decreto n.º 37/74, de 8 de Fevereiro;
i) Portaria n.º 563/76, de 10 de Setembro;
j) Portaria n.º 121/80, de 17 de Março;
l) Portaria n.º 719/81, de 22 de Agosto;
m) Portaria n.º 922/82, de 30 de Setembro;
n) Portaria n.º 923/82, de 30 de Setembro;
o) Portaria n.º 984/84, de 27 de Dezembro;
p) Decreto-Lei n.º 25/85, de 18 de Janeiro;
q) Portaria n.º 324/85, de 29 de Maio;
r) Portaria n.º 332/85, de 31 de Maio;
s) Portaria n.º 333/85, de 31 de Maio;
t) Portaria n.º 336/85, de 1 de Junho;
u) Portaria n.º 651/85, de 2 de Setembro;
v) Portaria n.º 83/86, de 12 de Março.

Artigo 10.º

1 – O presente diploma entra em vigor 60 dias após a data da sua publicação.
2 – A partir da data da entrada em vigor, e até ao limite máximo de doze meses, podem continuar à venda os géneros alimentícios que não satisfaçam as disposições do presente diploma, desde que cumpram as exigências legais que lhe são aplicáveis à data da publicação deste decreto-lei.

Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 6 de Abril de 1989. – Aníbal António Cavaco Silva – Luís Francisco Valente de Oliveira – Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto – Luís Fernando Mira Amaral – Roberto Artur da Luz Carneiro – Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares – Joaquim Martins Ferreira do Amaral.

Promulgado em 19 de Maio de 1989.

Publique-se.

O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 25 de Maio de 1989.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.

Veja também

Norma NP 225

Norma NP 225, Comissão Técnica C 530 /CT 53, ano 1961, Referente a Agar-agar. Definição e características