Resolução do Conselho de Ministros n.º 114/2006, de 15 de Setembro

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Resolução do Conselho de Ministros n.º 114/2006

PÁGINAS DO DR : 6730 a 6809

O reconhecimento pelo Governo de que as florestas representam uma prioridade nacional e de que o sector florestal é estratégico para o desenvolvimento do País conduz à necessidade de que exista, em consequência, uma Estratégia Nacional para as Florestas.
A necessidade de que as florestas possuam um quadro de referência geral a médio prazo que seja reconhecido pela sociedade e por todos os agentes do sector conduziu já em 1996 à adopção unânime pela Assembleia da República da Lei de Bases da Política Florestal e à elaboração em 1998 do Plano de Desenvolvimento Sustentável da Floresta Portuguesa.
A adopção de um novo documento estratégico sobre o sector reveste-se, no entanto, de particular importância. Por um lado, existem sempre novos elementos e desenvolvimentos que justificam ajustamentos periódicos de qualquer estratégia, e são disso exemplo a maior dimensão que têm vindo a tomar os incêndios ou o aparecimento de novos problemas como o do nemátodo da madeira de pinheiro. Por outro, conclui-se no continente o processo de elaboração dos planos regionais de ordenamento florestal (PROF) e as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira desenvolveram processos de reflexão sobre as suas próprias estratégias regionais. Mas, a oportunidade desta nova estratégia reside também no facto de ela poder enquadrar a utilização dos recursos do Fundo Florestal Permanente e beneficiar muito para a sua implementação das medidas de apoio ao sector que se desenham no âmbito do próximo período de programação (2007-2013).
A Estratégia Nacional para as Florestas insere-se na Estratégia Florestal da União Europeia e concretiza-se desde já com a adopção de medidas no âmbito do Quadro de Referência Estratégica Nacional (QREN) e do Plano Estratégico Nacional do Desenvolvimento Rural (PENDR) e em planos e programas especiais, como os da Defesa da Floresta contra Incêndios (PNDFCI) ou o da Luta contra o Nemátodo do Pinheiro (PROLUMP), onde são definidos os objectivos específicos, as metas, a repartição de responsabilidades e o quadro de recursos humanos e financeiros.
Por isso, a Estratégia Nacional para as Florestas não é só mais um documento de reflexão do sector, pretendendo-se que seja sobretudo o elemento de referência das orientações e planos de acção públicos e privados para o desenvolvimento do sector nas próximas décadas.
Assim, para que esta seja de facto uma estratégia nacional, era importante que a sociedade e os agentes públicos e privados do sector participassem nessa construção e nela se reconheçam. A necessidade de que a discussão da Estratégia se baseasse numa análise crítica, informada e o mais independente possível fez com que a discussão se fizesse a partir de um documento de partida elaborado pela Direcção-Geral dos Recursos Florestais (DGRF), sob a coordenação de um especialista de reconhecida experiência internacional nestas matérias e perito do Banco Mundial, Luís Constantino. Procurava-se com aquele documento apresentar uma lógica de abordagem ao sector que fundamentasse os elementos essenciais das opções estratégicas propostas que se pretendiam claras, evitando as facilidades de lugares comuns e de aparentes consensos, de forma a provocar a necessária discussão pública. E a força e dimensão da discussão pública, que se iniciou simbolicamente no Dia Mundial da Floresta e tomou as mais variadas formas, foi a prova indiscutível da necessidade e oportunidade da Estratégia, ao mesmo tempo que reafirmou a existência de um sector cujo dinamismo, espírito crítico e inconformismo são a melhor garantia das perspectivas de futuro para as florestas nacionais.
O documento da Estratégia inicia-se com a demonstração do valor dos recursos florestais para a sociedade, integrando as diversas funções e as diversas valências económicas, sociais e ambientais. O documento aborda em seguida o quadro das mudanças de contexto operadas nas últimas décadas, desde as alterações climáticas e os fenómenos de globalização até às questões de despovoamento rural do interior e crescente urbanização do litoral, com referência às respostas políticas desenvolvidas no passado.
A Estratégia é em seguida apresentada, suportada numa matriz estruturante do valor das florestas, que se pretende maximizar através de seis linhas de acção estratégicas, que, a curto prazo, tendem a minimizar os riscos de incêndios e dos agentes bióticos e, a médio prazo, a assegurar a competitividade do sector.
As seis linhas de acção estratégicas consideradas na Estratégia Nacional para as Florestas são:
Minimização dos riscos de incêndios e agentes bióticos;
Especialização do território;
Melhoria da produtividade através da gestão florestal sustentável;
Redução de riscos de mercado e aumento do valor dos produtos;
Melhoria geral da eficiência e competitividade do sector;
Racionalização e simplificação dos instrumentos de política.
Finalmente, é apresentada a matriz de responsabilidades que clarifica, quantifica e calendariza as acções a desenvolver.
As estratégias regionais florestais das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira integram de forma autónoma a Estratégia Nacional para as Florestas, tendo também sido vertidas para o corpo do texto principal as respectivas realidades regionais e as principais opções estratégicas. Esta integração resultou da articulação entre as autoridades florestais nacional e regionais e em conformidade com o solicitado pelos respectivos Governos Regionais.

Assim:
Nos termos da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve:
Aprovar a Estratégia Nacional para as Florestas, anexa à presente resolução, da qual faz parte integrante.
Presidência do Conselho de Ministros, 17 de Agosto de 2006. – O Primeiro-Ministro, José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.

ESTRATÉGIA NACIONAL PARA AS FLORESTAS

1 – Valor dos recursos da floresta.
1.1 – Uma fonte de riqueza.
A evolução no sector florestal mede-se em décadas. Devido aos longos períodos de crescimento da floresta, o que existe hoje resultou de intervenções realizadas há muito tempo e o que se faz agora terá consequências para a vitalidade do sector daqui a um século.
Durante o século XX, o sector florestal português teve um desempenho surpreendente. No Continente a área de espaços florestais arborizados aumentou muito significativamente sobretudo devido ao sobreiro e pinheiro bravo até à década de 70 e ao eucalipto desde a década de 50 (Fig. 1), atingindo em 1995 um valor máximo de 3.3 milhões de hectares. Processos equivalentes mas de dimensão desigual ocorreram nos Açores e Madeira, onde só a arborização de baldios pelo Estado representou, desde a década de 50 até ao meio da década de 70, cerca de 28 mil hectares e 17 mil hectares, respectivamente.
(ver documento original)
No Continente, para além da acção do Estado, a evolução da área florestal ficou sobretudo associada à crescente valorização que os proprietários florestais e a sociedade em geral têm vindo a reconhecer à floresta em comparação com outros usos de solo alternativos, em particular em relação aos matos (ou «incultos») até meados do século e, a partir dessa altura, em relação à própria agricultura.
Mas para uma Estratégia Nacional para as Florestas, que incidirá sobre os espaços florestais, incluindo também as áreas de matos e pastagens, importa considerar a valorização que o conjunto da sociedade atribui ao seu conjunto, de modo a maximizar o seu valor. Essa valorização pode agora ser efectuada de forma global considerando não só os valores de uso directo (comercial) dos produtos tradicionais da floresta como a madeira, a cortiça e a resina, como também outros menos vezes contabilizados. Estão neste caso valores de uso directo referentes a produtos não lenhosos (mel, frutos, cogumelos, plantas aromáticas) mas também ao pastoreio, à caça, à pesca, e ao recreio, e a valores de uso indirecto, como os referentes à protecção do solo e dos recursos hídricos, ao sequestro de carbono, e à protecção da paisagem e da biodiversidade.
Uma estimativa relativa a 2001 apontava o valor de 1,3 mil milhões de euros como sendo a produção económica total anual efectiva da floresta no Continente, não descontando as externalidades negativas (Mendes, 2005). Esta abordagem permite a comparação com estimativas equivalentes do valor por unidade de área efectuadas para os países do Mediterrâneo (Fig. 2) em estudos coordenados por Merlo e Croitoru (2005) e divulgados pelo Millenium Ecosystem Assessment (2005).
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Desses estudos conclui-se que o valor económico total das florestas do Continente ultrapassa em muito, por unidade de área, os valores encontrados para outros países mediterrâneos, tanto em produtos comerciais como em produtos ambientais. Portugal extrai mais riqueza de um hectare de terra florestal do Continente (344 euros/ha/ano) do que qualquer outro país do Mediterrâneo e esta comparação inclui países como a França (292 euros/ha/ano) e a Espanha (90 euros/ha/ano). Conclui-se, por isso, que a contribuição anual das florestas para o bem-estar público é muito superior em Portugal comparativamente a outros países do Mediterrâneo, o que demonstra uma taxa de utilização da terra florestal eficiente. Desta análise também se conclui que o elevado valor económico total da floresta não se refere apenas à sua realização comercial, mas também aos serviços ambientais e sociais que presta.
Por outro lado, a floresta tem sido a base de um sector da economia que gera cerca de 113 mil empregos directos ou seja 2% da população activa. Este número tem-se mantido mais ou menos constante durante as últimas duas décadas o que, com o nível de produção que se tem verificado, sugere um crescimento na produtividade do trabalho no sector. O sector representa também cerca de 10% das exportações e 3% do Valor Acrescentado Bruto (Anexo I), valor só ultrapassado na Europa dos 15 pela Finlândia e Suécia. São, no entanto, distintas as trajectórias das diferentes fileiras industriais:
– A fileira da madeira de serração tem vindo a assistir a um fenómeno de concentração, com o desaparecimento de pequenas serrações. As estatísticas apontam para que o número de serrações tenha diminuído de 732, em 1998, para cerca de 290, em 2005 (AIMMP, 2005), mantendo-se, no entanto, o volume de vendas, o que evidencia o dinamismo da fileira e a sua capacidade de se ajustar às mudanças.
– A fileira da pasta e papel contribui para cerca de 4 mil empregos directos (CELPA, 2005) mas a sua principal evolução tem sido no aumento da integração vertical no sector, com maior produção de papel e cartão, o que conduz a um acréscimo notável de valor do produto, evolução que tende ainda a aumentar.
– A fileira da cortiça representa uma importante fracção no comércio externo nacional, com cerca de um terço do total das exportações. O número de empresas desta fileira era de 828 em 2003, sendo o número de empregos por elas gerados mais de 12 mil (APCOR, 2005).
Assim, mantendo a silvicultura e as indústrias da madeira e da cortiça as suas contribuições ao nível do valor acrescentado e tendo vindo a indústria do papel, das artes gráficas e edição de publicações a aumentar a sua contribuição, o VAB do sector florestal tem mostrado uma tendência clara de crescimento nas últimas décadas (Fig. 3).
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A par da elevada produtividade e da integração vertical, o sector florestal é também positivamente atípico em relação ao de muitos outros países pela diversificação da actividade económica que apresenta. Para além dos produtos madeireiros baseados nas duas espécies dominantes na produção lenhosa, pinheiro e eucalipto, e da actividade corticeira, o sector florestal tem outros pólos economicamente activos a uma escala local.
É o caso da produção de frutos secos cuja produção tem aumentado de valor ao longo das últimas duas décadas (Fig. 4).
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Por sua vez, também a caça tem vindo a ser progressivamente organizada em zonas ordenadas, sendo que as referentes às áreas associativas e em especial às turísticas, que representam uma área já muito significativa (Quadro 1), valorizam a actividade de forma muito acentuada (Mendes, 2005; Carmo, 2005).

QUADRO 1
Síntese de alguns indicadores das zonas de caça em 2005
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Também a pesca desportiva nas águas interiores tem tido grande incremento nos últimos anos, associado ao cada vez maior interesse pelas actividades de ar livre e à aproximação ao meio rural. O número de pescadores desportivos mais do que triplicou desde 1980, ano em que se venderam 74 mil licenças de pesca, até 2005, ano em que o número de licenças vendidas foi de 261 mil (Fig. 5).
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Por outro lado, verifica-se um aumento substancial da percentagem de licenças de pesca nacionais e regionais relativamente ao total de licenças vendidas, evolução esta que indicia um grande aumento da mobilidade dos pescadores e um consequente aumento do dispêndio feito com esta actividade, quer através da aquisição de equipamentos cada vez mais caros, quer pelo recurso a infraestruturas turísticas junto dos locais onde se dirigem para pescar. Inquéritos à pesca desportiva realizados pela DGRF conduzem a estimativas das despesas efectuadas anualmente por pescador de cerca de quinhentos euros, atingindo um valor total de cerca de 130 milhões de euros, dos quais 106 milhões (64.5%) poderão ser atribuídos aos espaços florestais.
Mas a floresta produz muitos outros bens e serviços, como o da sua função como sumidouro de carbono, sendo o crescimento lenhoso um factor de mitigação do efeito de estufa pela correspondente absorção de CO(índice 2). O crescimento da floresta portuguesa é quantificado e contabilizado nos acordos internacionais a que Portugal aderiu, e pode representar uma ajuda para compensar as emissões de outras actividades, nomeadamente da indústria e dos transportes.
Em resumo, a floresta portuguesa tem características de um sector competitivo tanto no mercado interno como externo e uma flexibilidade que lhe tem permitido ajustar-se a choques externos. A floresta é ainda um suporte importante para a criação de emprego e apresenta diversificação de actividades, algumas das quais importantes em regiões economicamente desfavorecidas.
1.2 – Factores de sucesso.
As comparações internacionais e a evolução nacional do valor da floresta apontam para que o sector florestal português possa ser de algum modo considerado como um caso de sucesso. E a esse sucesso não são certamente estranhas as condições ecológicas que foram favoráveis às espécies utilizadas, a par com a pouca concorrência da agricultura, actividade menos privilegiada pelas condições fisiográficas do país.
Mas o desenvolvimento do sector também foi resultado de políticas florestais do passado, em especial as que tiveram reflexo na propriedade privada, já que esta sempre representou a grande fatia da floresta nacional.
No Continente a propriedade privada corresponde a 2,8 milhões de hectares de espaços florestais arborizados, ou seja, 84,2% do total, dos quais 6,5% pertencentes a empresas industriais. As áreas públicas correspondem a 15,8% do total, dos quais apenas 2% (a menor percentagem na Europa) são do domínio privado do Estado.
Na Região Autónoma da Madeira a área total florestada é de 35,6 milhares de hectares, dos quais 15,5 milhares de hectares são ocupados por floresta natural e 20,1 milhares de ha por floresta exótica. Nesta região o regime jurídico das propriedades distribui-se do seguinte modo: superfície na posse de proprietários privados – 35,8 milhares de hectares; logradouros comuns das populações – 4,0 mil ha; propriedades comunitárias – 11,4 mil ha; zonas florestais públicas – 3,9 mil ha; e propriedades camarárias – 1,0 mil ha.
Na Região Autónoma dos Açores, dos cerca de 235 mil hectares de superfície total, cerca de 30% são terrenos ocupados por floresta, dos quais 8% correspondem a floresta natural. Do total de floresta de produção, 67% pertence ao sector privado e 33% ao sector público.
As políticas florestais do passado criaram assim, consciente ou inconscientemente, um ambiente propício à actividade florestal privada, em contraste com muitos outros países onde, em fases de desenvolvimento equivalente (em relação a Portugal na primeira metade do século XX), as políticas florestais afugentaram e inibiram o sector privado e seguiram modelos mais estatizantes.
Até 1974 o Estado Português seguiu políticas que não favoreceram a pequena agricultura. Estas políticas conduziram indirectamente a incentivos positivos para a actividade florestal, já que as duas competem pela utilização do solo.
A intervenção dos serviços da administração pública com responsabilidades no sector florestal privilegiou, quase sempre, a arborização das áreas sob administração pública, as quais representam, no continente, como já se viu, uma percentagem pequena das áreas com ocupação florestal (15,8%). Mas o Estado Português também ofereceu incentivos directos à ocupação florestal através da atribuição de subsídios para a florestação em áreas privadas.
Apesar das intervenções estatais terem privilegiado os espaços florestais de grande dimensão, elas também contribuíram para criar uma superfície florestal com escala suficiente para sustentar o desenvolvimento industrial a jusante, o que por sua vez valorizou a produção da pequena propriedade privada.
Os proprietários privados foram, assim, os principais responsáveis pelo aumento da área florestal, pelo estabelecimento de montados e pela disseminação das áreas de pinhal, a que se juntou, a partir dos anos 50, a expansão do eucaliptal (Fig. 1) que, nalgumas zonas, substituiu parcialmente o pinhal, entretanto cada vez mais afectado pelos incêndios.
Mas o que teria levado milhares de pequenos proprietários privados a reflorestarem sem ajudas directas do Estado? Isto é necessariamente um resultado de taxas de retorno favoráveis ao investimento na floresta nas condições tecnológicas adoptadas por esses proprietários. Eram processos de muito baixa tecnologia em sementeira directa ou plantação à cova com base em trabalho manual.
Exercícios efectuados com dados recentes demonstram que até nas condições actuais os principais tipos de floresta têm capacidade de gerar rendimentos fundiários e empresariais, em estações de qualidade média, superiores a 50 euros/ha/ano. Estes rendimentos, quando comparados com os valores negativos relativos à agricultura de sequeiro sem subsídios, apresentam alternativas altamente favoráveis (Fig. 6).
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Um aspecto em que a administração pública tem contribuído positivamente para o desempenho florestal é no financiamento, já que ele tem tido um êxito considerável em afectar recursos públicos, de origem externa ou interna, para a viabilização do sector. Estes apoios ao sector têm vindo a crescer desde 1965, através do Fundo de Fomento Florestal seguido pelo Projecto Florestal Português/Banco Mundial e pelos quadros comunitários de apoio (Fig. 7).
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2 – Mudanças de contexto e novos riscos.
O sector florestal atravessou duas fases diferentes no último século. A primeira fase concentrou-se na expansão da área florestal, ou noutras palavras, na criação do recurso floresta. A segunda fase correspondeu à expansão industrial com um aumento da taxa de utilização do recurso. A terceira fase, em que iremos agora entrar, será necessariamente a da melhoria da qualidade, da eficiência e do valor agregado do sector em áreas específicas.
As últimas três décadas foram no entanto de grande turbulência para o sector florestal. Factores externos e internos contribuíram para criar uma imagem de altos riscos de investimento e de gestão associados ao mesmo. Esta imagem tem a sua base em riscos reais e em riscos e incertezas apenas percebidos. Esta percepção de riscos torna-se crítica porque o sector florestal português se desenvolveu principalmente com base na actividade privada (ao nível da floresta e das indústrias). O desenvolvimento futuro do sector terá de continuar a basear-se na actividade privada, até pelas dificuldades orçamentais do Estado Português, das estratégias de redução da dimensão das funções do Estado na economia e das incertezas relativamente aos financiamentos externos, nomeadamente os oriundos da União Europeia. Mas, a menos que os riscos percebidos sejam reduzidos, será difícil continuar a assegurar o investimento privado no sector e poderá mesmo verificar-se desinvestimento.
Deste modo, de forma a manter os altos valores económicos associados à floresta e de lhe assegurar competitividade e sustentabilidade, há que garantir que a diminuição dos riscos, tanto reais como percebidos, constitua uma componente importante da estratégia florestal para a próxima década. É sabido que sempre houve riscos na actividade florestal mas a magnitude que os riscos actualmente alcançaram é um fenómeno novo, interessando, por isso, rever os factores que contribuíram para tal mudança de contexto.
2.1 – Alterações climáticas.
O primeiro fenómeno de mudança de contexto é o das alterações climáticas. Apesar da dificuldade de prever os impactos do efeito de estufa a uma escala regional, todas as projecções analisadas pelo Intergovernmental Panel on Climate Change (IPPC) convergem nas projecções de aquecimento terrestre, acumulando-se evidência de que estes efeitos vão ser sentidos fortemente. Análises mais regionalizadas indicam uma vulnerabilidade especial para a região mediterrânica.
Para Portugal, na âmbito do projecto SIAM [Santos, F.; (et al.) 2002] identificam-se três períodos na evolução do clima durante o século XX: um aquecimento entre 1910 e 1945; um arrefecimento, entre 1946 e 1975; e um período de aquecimento, rápido, entre 1976 e 2000. Desde a década de setenta as temperaturas máximas e mínimas subiram, em Portugal Continental, cerca de 0,5ºC/década, o que corresponde a mais do dobro do aumento verificado na temperatura média mundial. Nos Açores as mesmas tendências existem mas com um menor acréscimo nas temperaturas máximas, enquanto que na Madeira as temperaturas máximas acompanham o acréscimo do Continente, mas as mínimas ultrapassam aquele ritmo, atingindo, respectivamente, acréscimos 0,7 e 0,5ºC/década (Fig. 8).
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Quanto à precipitação, as alterações observadas são irregulares não se detectando tendências significativas no seu valor médio anual. Todavia, detecta-se claramente a perda de precipitação na Primavera no período de 1971 a 2000 relativamente ao período anterior de 1941 a 1970 (Fig. 9).
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Variações relevantes foram ainda observadas para outras variáveis climáticas, como seja a humidade relativa, nebulosidade e insolação, provando-se que o processo de aquecimento global é complexo, particularmente no que se refere à sua interacção com o ciclo da água.
A estimativa da evolução climática global ao longo do século XXI feita no âmbito daquele projecto prevê, durante o século XXI, um aumento significativo da temperatura média em todas as regiões de Portugal, que será acompanhado por um acréscimo na frequência e intensidade das ondas de calor. O aumento da temperatura será mais expressivo nas regiões do interior do Continente (7ºC) do que na zona litoral (3ºC). Embora com um maior grau de incerteza, estima-se a redução da precipitação na Primavera, Verão e Outono, com reduções que podem chegar a ser de 20% a 40%, com as maiores perdas a verificarem-se na região sul do Continente.
As alterações climáticas levantam importantes desafios ao sector florestal, que normalmente assenta em longas revoluções. As previsões vaticinam o aumento de produtividade e de sequestro de carbono apenas quando ocorra um aquecimento ligeiro do clima, sendo este húmido, como no caso típico dos Açores ou do Noroeste do Continente. Nas áreas sujeitas a períodos de secura, como no Sul do Continente ou em Porto Santo, por exemplo, espera-se uma redução na produtividade e no sequestro de carbono.
Os diferentes impactos das alterações climáticas no Continente podem ser representados no diagrama de Emberger, de utilização clássica na bioclimatologia florestal e calculado com base nos dados de precipitação anual e das temperaturas médias do mês mais frio e do mês mais quente que o Instituto de Meteorologia registou para as capitais de distrito desde 1941. Verifica-se um aumento das produtividades potenciais lenhosas nalgumas estações localizadas no Norte e Centro de Portugal Continental (Viana do Castelo, Braga, Porto e Aveiro) enquanto que noutras estações (Bragança, Guarda e Évora) essa evolução é negativa, em resultado das reduções na precipitação anual e no aumento das amplitudes térmicas (Fig. 10).
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Em resultado das alterações climáticas, poderão verificar-se mudanças quanto ao domínio de algumas espécies e nas áreas de distribuição dos diversos tipos de floresta, assim como um aumento do risco de desertificação, podendo algumas espécies florestais sofrer mortalidade acentuada no limite mais seco da sua actual área de distribuição. As previsões, com todas as suas limitações, apontam para:
– A substituição, a Norte, de parte dos povoamentos de pinheiro e eucalipto por floresta mais esclerófita, que hoje em dia tem maior presença no sul – e.g. sobreiro;
– A redução, no Sul, das áreas ocupadas com floresta, nomeadamente dos montados que serão substituídos por matos.
Uma das características importantes das alterações climáticas previstas e observadas é a do aumento de frequência dos fenómenos extremos (cheias, tempestades, secas e ondas de calor). Estes fenómenos já aumentaram à escala global, conduzindo a prejuízos económicos muito significativos cujo valor aumentou cerca de 10 vezes desde a década de 1950 até à década de 1990 (Fig. 11).
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2.2 – Incêndios.
Uma expressão do efeito das mudanças climáticas é o aumento do fenómeno dos incêndios florestais que são, hoje em dia, certamente o maior dos riscos percebidos no sector florestal. E não pode ser casual a coincidência dos padrões observados na Europa para a evolução da área ardida nos últimos 50 anos (Fig. 12) e dos registados para os fenómenos extremos à escala global (Fig. 11).
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São os grandes incêndios provenientes do espaço rural que atingem as dimensões causadoras dos grandes prejuízos à sociedade, acabando por atingir por vezes os próprios espaços urbanos. Os médios e grandes incêndios (mais de 100 ha) constituíram mais de 85% da área ardida nos anos de 2003 a 2005. Qualquer estratégia de controlo dos incêndios florestais deverá por isso considerar os aspectos particulares aos incêndios de maior dimensão.
Um primeiro aspecto particular aos grandes incêndios é o de que ocorrem em condições meteorológicas extremas. Para o território continental, a importância das condições meteorológicas extremas na área ardida total pode ser resumida na comparação dos dois gráficos da Fig. 13. Eles mostram o número de dias de 15 de Maio a 15 de Outubro em que se observaram as diferentes classes de risco meteorológico de incêndio nos anos de 2000 a 2005 e o correspondente resultado em áreas ardidas. De registar que, nos últimos três anos, aos poucos dias de risco muito elevado (13, 8 e 18 dias) corresponderam áreas ardidas respectivamente de 299, 62 e 168 mil hectares.
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Um segundo aspecto particular dos incêndios de mais de 100 ha é o de que a probabilidade da sua ocorrência só é significativa a partir de durações superiores a 24 horas (DGRF, 2005). Sabendo-se, por outro lado, que existe uma relação estreita entre a rapidez de intervenção e a duração do incêndio (e também portanto a sua dimensão) é de grande importância promover o objectivo de melhorar a rapidez de intervenção.
Um terceiro aspecto importante dos grandes incêndios é o de que existe um padrão, que se mantém constante de 1980 a 2005, que indica que, contrariamente aos pequenos incêndios, a maioria das extinções corresponde ao período da noite, aproveitando as condições favoráveis à extinção. A partir deste conhecimento pode concluir-se que a colaboração entre bombeiros e sapadores florestais pode potenciar o esforço de extinção e rescaldo durante a noite, aproveitando todo o trabalho e experiência de redução de combustíveis feito pelos sapadores, por vezes com a utilização do próprio fogo.
Um quarto aspecto está relacionado com a alteração da população no interior. Não há análises detalhadas sobre o impacto do despovoamento humano no sector florestal, mas várias hipóteses têm sido avançadas. Uma é que o despovoamento leva a um aumento na dimensão das áreas ardidas no interior, devido a uma menor capacidade informal de detecção e de participação no combate. A segunda hipótese é que o êxodo rural disponibilizou áreas agrícolas para o uso florestal, ou conduziu ao abandono e ao aparecimento de matos, originando manchas combustíveis mais contínuas. A terceira hipótese é que a ausência dos proprietários levou ao abandono da gestão florestal tradicional (roça do mato, cortes selectivos e resinagem) conduzindo à acumulação da biomassa. A diminuição da pastorícia teria efeito idêntico. De facto, as alterações de contexto socio-económico subtraíram à floresta toda uma série de funções e de agentes indispensáveis ao seu desempenho estável e equilibrado. Tratam-se de funções e de agentes que no quadro da utilização tradicional do território, permitiam a manutenção de um espaço florestal com uma estrutura e uma composição de elevada exigência ao nível da manutenção (limpezas, desbastes, etc.) e do controlo (vigilância, operacionalidade, etc.), apenas conseguidas mediante as sinergias estabelecidas com os sistemas de produção agrícola e animal. O actual desajuste entre as características da sociedade e a estrutura e composição da floresta só foi possível pela forma acelerada como se concretizou e continua a concretizar a urbanização da população portuguesa quando comparada com o período de revolução dos sistemas de silvicultura (espécies, regimes e modos de tratamento) praticados na generalidade do espaço florestal.
Um último aspecto a considerar é o de que os grandes incêndios tendem a ser pouco selectivos, isto é, percorrem tipos de florestas que, em condições normais, são menos susceptíveis aos incêndios. Comparando a composição das áreas ardidas entre 1996 e 2005 com a composição dos espaços florestais em 1995 (Fig. 14) verifica-se que, nos anos de grandes incêndios, tipos de espaços florestais normalmente menos susceptíveis aos incêndios (como os dominados por sobro) constituem uma fracção significativa das áreas ardidas. Este aspecto tem particular relevância no desenho de estratégias especiais para condições extremas de propagação.
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No entanto, o maior impacto dos incêndios nas últimas duas décadas tem sido nos povoamentos de pinheiro bravo e de eucalipto o que não pode deixar de estar associado a reduções na produção de madeira. Este facto é especialmente relevante para o pinheiro bravo, que demonstra uma tendência para uma redução gradual dos seus volumes explorados, enquanto que para o eucalipto se assiste a um aumento dos volumes explorados, mas menor do que seria expectável a partir do aumento da sua área, indicando quebra na produtividade (Fig. 15).
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De qualquer forma, a real dimensão do problema dos incêndios ultrapassa em muito a questão da diminuição da produção de material lenhoso, e essa avaliação pode agora fazer-se pela estimativa do seu custo social, que constitui a mais negativa das externalidades associadas à floresta. De facto, para um valor económico total do espaço florestal estimado em 2001 em 1,3 mil milhões de euros, contrapõem-se estimativas de custo social dos incêndios florestais que variaram no período 2000-2004 entre 0,2 e 1,0 mil milhões de euros (no ano extremo de 2003), ou seja, entre 20 a 80% da produção anual de riqueza florestal. As componentes daquele custo social constam no Anexo II.
Da análise dos custos sociais dos incêndios conclui-se que o valor médio investido anualmente em actividades de prevenção e de combate foi, de 2000 a 2004, de 18,3 euros por hectare de espaço florestal existente (povoamentos e matos), valor ligeiramente superior aos publicados internacionalmente, que se situam em média nos 16 euros/ha. O valor investido em prevenção foi, em média, de metade do investimento em combate (5,7 euros/ha de prevenção e 12,6 euros/ha em combate). O valor de prevenção e combate corresponde a 0,6 milhares de euros por hectare de área ardida (povoamentos ou matos). Os custos associados às perdas de bens e serviços e à recuperação de áreas ardidas foram, em média, de 3,5 milhares de euros por hectare de povoamento florestal ardido, repartidos por 2,5 milhares de euros/ha de perdas e 1,0 milhar de euros/ha de recuperação.
As perdas são muito grandes e as percepções de risco associado aos incêndios florestais são provavelmente ainda maiores, tornando ainda mais importante que a minimização dos riscos de incêndio constitua uma componente fundamental da Estratégia Nacional para as Florestas.
2.3 – Pragas, doenças e invasoras.
O clima afecta a sobrevivência e o desenvolvimento dos agentes patogénicos, assim como, de modo indirecto, as interacções entre estes e o seu hospedeiro que, em condições de maior severidade climática, se apresenta num estado de maior stress e, por isso, mais sensível ao ataque daqueles agentes bióticos. Também é provável a migração de agentes patológicos em função das alterações climáticas. Finalmente as modificações do clima poderão potenciar a propagação de espécies invasoras a novas áreas, com reflexos directos na redução da biodiversidade, como no caso da Laurissilva (Fig. 16) e na produção de produtos lenhosos, não lenhosos e dos valores de uso indirecto.
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Problemas fitossanitários afectam significativamente o sobreiro e a azinheira, sendo o declínio dos montados evidenciado nas sucessivas medições que têm sido feitas na rede europeia de parcelas permanentes de amostragem para a monitorização dos ecossistemas florestais, actualmente implementada através do Regulamento Forest Focus da Comunidade Europeia. Os resultados desse trabalho apresentam-se na Fig. 17 para as quatro espécies mais representativas de Portugal Continental – sobreiro, azinheira, pinheiro bravo e eucalipto.
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A observação da Fig. 17 revela um aumento significativo, particularmente evidente a partir de 1997, na percentagem de árvores de sobreiro e azinheira com baixa vitalidade.
Mas já a partir da década de 70 se tinha começado a verificar um anormal e contínuo agravamento do estado sanitário dos montados, à semelhança do que acontece noutros países da bacia mediterrânica (Espanha, França, Itália, Marrocos e Tunísia). Esse declínio atinge actualmente, nalgumas estações, aspectos bastante críticos, encontrando-se, por todo o país, tanto povoamentos como árvores individuais com mau aspecto vegetativo e uma sintomatologia denunciadora de um enfraquecimento progressivo.
A dimensão do problema tem consequências claras para o valor económico da componente cortiça, ao reduzir as quantidades produzidas anualmente (Fig. 18). Esta redução é preocupante para a indústria que alerta para que a produção total dos anos 90 representou menos 21% do que a média dos anos 70 e menos 34% do que a média dos anos 60 (Amorim, 2005).
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A investigação efectuada sobre o assunto, mostra que os montados estão a ser fragilizados por um conjunto de processos lentos e cumulativos que têm que ser claramente quantificados e contra os quais é necessário tomar medidas.
As medidas a tomar para obviar ao fenómeno do declínio do montado serão necessariamente medidas de envergadura, obrigando ao envolvimento sinergístico de todos os actores implicados na gestão dos montados, desde proprietários a nível individual, a associações de proprietários florestais até aos organismos da Administração Pública.
Mas não são só o sobreiro e a azinheira a ter problemas sanitários. No Continente, o castanheiro, o eucalipto e o pinheiro bravo também apresentam problemas, embora de natureza e dimensão variáveis. Nos Açores a criptoméria é, igualmente, afectada por fungos radiculares, em particular a Armillaria sp., embora não haja estimativas sobre o seu impacto económico.
A perda de vitalidade e mortalidade em pinheiro bravo está sobretudo associada ao problema do Nemátodo da Madeira do Pinheiro (NMP), uma praga detectada em Portugal, em 1999, em pinhais da região de Setúbal. A presença deste parasita, classificado como organismo de quarentena pela legislação comunitária, obriga o Estado Membro onde a sua presença é detectada a tomar medidas específicas de controlo que impeçam a sua disseminação pelo restante espaço europeu.
Sendo o pinheiro bravo a espécie florestal com maior expressão territorial em Portugal Continental, o Estado Português e os agentes económicos da fileira do pinho viram-se confrontados com uma situação de extrema gravidade, o que conduziu à elaboração do Programa Nacional de Luta Contra o Nemátodo da Madeira do Pinheiro – PROLUNP, iniciado ainda em 1999.
A análise da evolução da zona de restrição e do número de árvores com sintomas de declínio permite observar uma tendência crescente do seu número na zona afectada (Figura em anexo II), em particular depois do verão difícil de 2003. No Anexo II, além da evolução da área da zona de restrição e do número de árvores com sintomas de declínio, indica-se, também, para aquela zona, a evolução da área com ocupação de pinheiro bravo.
Para efeitos de uma estratégia florestal o que é importante aqui é assinalar o aumento, no futuro, da probabilidade de aparecimento de mais pragas e doenças, sendo necessário assegurar uma capacidade de detecção, isolamento e tratamento rápido da parte dos serviços responsáveis.
2.4 – Integração internacional e riscos de Mercado.
Outro aspecto da mudança do contexto em que se insere o sector florestal é o fenómeno da internacionalização. Dentro deste processo, os três factores de maior incidência no sector florestal português são: (i) a integração de Portugal na União Europeia; (ii) o aparecimento de vários tratados e convénios internacionais, principalmente os relativos a matérias do meio ambiente, e a adesão de Portugal a estes acordos; e (iii) no futuro a evolução das regras do comércio internacional.
A caracterização destes processos é apresentada no Anexo III.
O aspecto da economia global que terá talvez maiores repercussões no sector florestal português é o das negociações de comércio internacional. Desde o Uruguai Round e a subsequente evolução da regulamentação do comércio no contexto da Organização Mundial do Comércio, o sector florestal não tem figurado proeminentemente nas negociações, a não ser na parte industrial, mas esta não tem tido tratamento específico diferente do de outras indústrias. Com mais relevância para o sector florestal é a evolução dos acordos sobre a agricultura, que a curto ou longo prazo se traduzirão por maior liberalização e redução de incentivos directos à produção. Com a penetração no mercado de países altamente competitivos é provável, a longo prazo, mais um factor de abandono na agricultura portuguesa, o que disponibilizará áreas para a actividade florestal. Por outro lado também se espera uma evolução das restrições não tarifárias, nomeadamente no sentido de incluírem um certo número de considerações ambientais. Na área florestal isto poder-se-ia traduzir por requerimentos de certificação em certos mercados e para certos produtos.
A internacionalização da economia à escala global irá ter consequências no sector florestal. Ela terá designadamente reflexos no mercado dos produtos florestais, tanto na sua componente de consumo como sobretudo nos preços praticados, que tenderão a uma liberalização crescente, aspecto que poderá ocasionar problemas de competitividade nas diferentes fileiras silvo-industriais.
De facto, em Portugal, as tendências do mercado têm revelado, na última década, uma descida do valor unitário de diversas matérias-primas da produção lenhosa florestal (Fig. 19 e Fig. 20).
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Esta tendência de decréscimo dos preços das matérias primas está associada à descida dos preços médios de mercado dos produtos florestais em toda a Europa Ocidental, descida que tem aproximado os preços aos praticados nos Países do Leste Europeu e da Comunidade de Estados Independentes, que têm, por sua vez, convergido para os valores praticados na Europa Ocidental (Ponto 9.3 do Anexo III).
Esta tendência de convergência nos preços seria sempre de esperar num quadro de globalização da economia. Com a liberalização dos mercados a países do hemisfério Sul, esta convergência tenderá também a incluir países como o Brasil e a África do Sul. Nestes países, pelas suas condições naturais e sociais, a matéria prima é produzida a preços mais baixos. Segundo o estudo Review of Wood Pricing Systems in Europe (CELPA e Jaakko Pöyry, 2005) em 2004 o preço à porta da fábrica do Eucalyptus grandis foi próximo dos 20 euros/m3, no Brasil, e dos 30 euros/m3, na África do Sul, tendo sido, em Portugal, próximo dos 40 euros/m3 para o Eucalyptus globulus. De qualquer forma para que essa competição se faça para os mercados da Europa há ainda que considerar os custos de transporte associados. Espera-se, por isso, uma crescente estabilidade dos preços em resultado da globalização.
Para além dos preços, são ainda de considerar as dificuldades que poderão surgir no abastecimento em matérias-primas de origem nacional. Na verdade a sustentabilidade do abastecimento em produtos lenhosos tem vindo a ser seriamente ameaçada pelos riscos associados ao sector florestal, em particular os ocasionados pelos incêndios. Igualmente, os custos de produção e a qualidade dessas matérias-primas poderão não ser competitivos nos mercados internacionais sobretudo por, generalizadamente, se adoptarem modelos de gestão inadequados, com reflexos na situação de sub-lotação da floresta portuguesa e na perda de eficiência daí resultante.
A simples análise de dados de inventário relativos ao estado dos povoamentos florestais revela condições de possível melhoria da produtividade lenhosa em grandes superfícies florestais. De facto, apesar de nas últimas décadas se ter assistido a um aumento significativo dos custos de produção, nomeadamente, devido a uma intensificação das técnicas utilizadas na instalação e gestão dos povoamentos, esse acréscimo não se traduziu em incrementos substanciais na qualidade das matérias primas produzidas, paradigma que deverá ser alterado mediante a promoção da adopção de técnicas adequadas e pela sua crescente validação através de processos de certificação.
A fileira da cortiça encontra-se numa situação bem distinta da dos produtos lenhosos. Nesta fileira, em cujo mercado Portugal é claramente dominante (responsável por aproximadamente metade da produção e das exportações), tem-se assistido, nas últimas décadas, a flutuações importantes mas a uma tendência de acréscimo global da valorização do produto, embora se verifique um ligeiro decréscimo nos últimos anos (Fig. 21).
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Nesta fileira, para além da degradação quantitativa e qualitativa do montado de sobro, que pode pôr em risco a sustentabilidade do abastecimento desta matéria-prima, a forte especialização da produção num único produto final, a rolha de cortiça, que representa 2/3 do valor das exportações de cortiça, faz com que o sector veja com preocupação a erosão das vendas de rolha, designadamente pelo aparecimento de produtos sucedâneos (rolhas de plástico e cápsulas de alumínio) neste nicho do mercado. Esta opção ocorre especialmente em novos produtores, já que os preços das rolhas de plástico e das cápsulas de alumínio são significativamente mais baixos do que os das rolhas de cortiça. Questões associadas à qualidade do processamento da cortiça foram também invocadas para a opção pela rolha de plástico, o que conduziu a um mais apertado controle de qualidade. Por isso, o European Forest Sector Outlook Study (UNECE, FAO, 2005) prevê um crescimento estável e moderado do mercado de rolha de cortiça, «por parecer muito pouco provável que a maior parte dos produtores de vinhos venham a escolher materiais alternativos, desde que o produto se mantenha competitivo em preço e qualidade». Mas, de qualquer forma, a promoção do produto tem de ser garantida.
2.5 – Serviços ambientais.
Os serviços ambientais da floresta sempre foram reconhecidos tendo dado origem, logo no início do século XX, à instituição do Regime Florestal. Para além da arborização das dunas, que será tratada adiante, o Regime Florestal pretendia o revestimento florestal dos terrenos cuja arborização fosse de utilidade pública, nomeadamente para «o bom regime das águas e defesa das várzeas» e para «a fixação e conservação do solo nas montanhas». Foi esta uma das principais justificações que deram origem à arborização pelo Estado dos terrenos baldios, que representam neste momento áreas significativas tanto no Continente (Fig. 22) como nos Açores e Madeira, sendo que nestas duas Regiões a importância desta função se torna ainda mais fundamental tendo em conta a orografia.
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Na Europa, esta função de protecção associada à floresta tem sido fundamentalmente assegurada pelo Estado, não sendo um serviço pago pelo mercado. Mas, actualmente, onde não há mercados, aparecem por vezes outras formas de pagamentos pela produção de serviços. Por exemplo, a cidade de Nova Iorque compensa os proprietários da bacia hidrográfica com cobertura florestal que abastece água à cidade, para estes manterem esse coberto. Pagamentos semelhantes são feitos noutros países para promover ocupações do solo que reduzam o assoreamento de barragens e lhes prolonguem a vida útil. Em vários países têm-se também observado um crescimento rápido de zonas de protecção privadas, por vezes com objectivos comerciais ligados ao turismo.
As reivindicações e a reclamação de direitos em relação aos serviços ambientais do espaço florestal foram fenómenos de crescente importância na última parte do século vinte, conduzindo a uma valorização dos bens de uso indirecto. Estes fenómenos, que se estenderam a todo o mundo, tiveram a sua origem em vários factores, destacando-se a expansão e o activismo crescente das Organizações Não Governamentais do sector, a democratização de muitos países (América Latina, Europa do Leste), a urbanização e a mais ampla disponibilidade de informação.
Entre os serviços ambientais do espaço florestal destacam-se, para além da protecção dos solos e da conservação de recursos hídricos, o sequestro de carbono, a protecção da paisagem e biodiversidade e o recreio. E estes são temas em que se tem verificado intervenção pública, apesar de alguns destes serviços serem controversos, quer dizer, não estar por exemplo estabelecido que a floresta, e que tipo de floresta, produz mais serviços de paisagem ou biodiversidade do que ocupações alternativas do solo, tais como incultos, pastagem ou agricultura.
A competição entre o uso florestal de consumo e de conservação tem sido conflituosa. A raiz do problema é que os direitos deste valor não estão definidos: pertencem a todos, e como consequência não existem mercados de bens ambientais ou estes são incipientes. O dono de uma propriedade florestal pode estar bem definido por lei, mas quem é o dono da água subterrânea de qualidade gerada por essa propriedade ou da paisagem gerada por um mosaico de propriedades e ocupações do solo? E mesmo que existissem proprietários definidos qual seria a natureza do bem que se transaccionaria em mercados? Sem mercados nem direitos de propriedade, cabe ao Estado intervir na resolução de conflitos sobre usos alternativos, e isto normalmente faz-se através de processos de negociação (políticos e administrativos) e instrumentos de comando e controlo. Alguns desses processos resultam mesmo da necessidade de atender às decisões e compromissos assumidos nas instituições internacionais. No caso português, pela sua importância para o sector florestal, destacam-se:
(1) A Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e da Biodiversidade (ENCNB), aprovada em 2001 e em vigor até 2010, assume três objectivos gerais – (i) conservar a Natureza e a diversidade biológica, (ii) promover a utilização sustentável dos recursos biológicos e (iii) contribuir para a prossecução dos objectivos visados pelos processos de cooperação internacional na área da conservação da Natureza em que Portugal está envolvido, em especial os objectivos definidos na Convenção sobre a Diversidade Biológica, designadamente a conservação da biodiversidade, a utilização sustentável dos seus componentes e a partilha justa e equitativa dos benefícios provenientes da utilização dos recursos genéticos. Para a concretização destes objectivos, a ENCNB formula 10 opções estratégicas, neles se enquadrando a constituição da Rede Fundamental de Conservação da Natureza e o Sistema Nacional de Áreas Classificadas (Fig. 23), integrando neste a Rede Nacional de Áreas Protegidas, assim como assegurar a conservação e a valorização do património natural dos sítios e das zonas de protecção especial integrados no processo da Rede Natura 2000;
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(2). O Programa de Acção Nacional de Combate à Desertificação (PANCD) aprovado em 1999 na sequência de compromissos assumidos internacionalmente, nomeadamente no quadro da Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação (CNUAD), da qual deriva o primeiro objectivo estratégico do PANCD relativo à conservação do solo e da água. No âmbito deste Programa foi elaborada, para o território continental, a carta de susceptibilidade à desertificação que se apresenta na Fig. 24, e que corresponde, em grande parte à distribuição da azinheira.
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(3). O Programa Nacional para as Alterações Climáticas (PNAC) define a estratégia nacional para o controlo e redução das emissões de gases de efeitos de estufa (GEE). O PNAC procura quantificar o esforço de mitigação das emissões necessárias para o cumprimento dos compromissos assumidos por Portugal no âmbito de Quioto e da UE, identificando as responsabilidades sectoriais, e em particular as do sector florestal. O PNAC 2006 foi preparado com base na actualização das estimativas do balanço de emissões de GEE e das medidas de redução que constavam do PNAC 2004. Essa actualização é concretizada pela introdução de medidas adicionais além das medidas de cenário referência já consideradas, que no caso da floresta são da seguinte grandeza:
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A produção de energia a partir de fontes renováveis é um processo essencial para atingir os compromissos assumidos no âmbito do protocolo de Quioto, nele se integrando o aproveitamento de biomassa para energia. Em 1997 a Comissão Europeia, no livro branco sobre energias para o futuro, assumiu o compromisso de até 2010 duplicar a utilização de Fontes de Energia Renovável (FER), aumentando para 12% a participação destas energias no balanço energético. Esse aumento será feito, nomeadamente através da:
– Produção de 22,1% de electricidade a partir de Fontes de Energia Renovável (para que esta meta seja atingida, 39% da energia eléctrica total consumida em Portugal terá que ser produzida a partir de FER, tendo sido fixadas metas indicativas para a produção de energia eléctrica a partir de biomassa e de biogás).
A taxa actual de utilização de Fontes de Energia Renováveis em Portugal é de apenas 9%. O aproveitamento da biomassa gerada nas matas em resultado da execução das acções de instalação, gestão e extracção de produtos florestais constitui um importante contributo para o aumento daquela taxa, facto já consignado no PNAC, que considera a biomassa e outros subprodutos e produtos florestais com um papel potencial para o aproveitamento energético. Apesar de as indústrias florestais estarem a utilizar cada vez mais biomassa para a produção de energia, a maior parte desta biomassa provém de resíduos da actividade madeireira ou industrial e não da recolha da biomassa combustível da floresta. De qualquer maneira é importante assinalar que a indústria respondeu positivamente aos incentivos oferecidos no passado. Através do Programa Prime e da medida MAPE, as unidades industriais concretizaram projectos de aproveitamento energético utilizando biomassa florestal em instalações de cogeração (caldeiras de biomassa).
Actualmente, o aproveitamento de biomassa florestal para a rede de energia eléctrica é seguido apenas por duas centrais termoeléctricas.
Para cumprir os objectivos estabelecidos para o aproveitamento da biomassa florestal será necessário construir novas centrais até 2010, estando actualmente a decorrer o «Concurso para Atribuição de Capacidade de Injecção de Potência na Rede do Sistema Eléctrico de Serviço Público e Ponto de Recepção Associado» para a adjudicação de novos pontos de ligação à rede para a produção de energia eléctrica a partir de biomassa florestal. Na Fig. 25 representa-se a carta de distribuição de biomassa florestal, que constitui uma base de informação territorial onde as intervenções a nível da implementação de medidas de silvicultura preventiva se tornam prioritárias de forma a diminuir a carga combustível e o risco de incêndio associado, e que segundo critérios de integração das políticas energética nacional e florestal suportará a definição de pontos injectores de energia.
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Assim, em consequência das preocupações ambientais e dos compromissos internacionais anteriormente descritos, verificou-se o aparecimento de uma série de instrumentos tais como as áreas classificadas (Fig. 23), as análises de impacto ambiental, e outros que se preocuparam com a protecção dos serviços ambientais, mas cujo valor não é capturado em mercados.
Entretanto há bastantes esforços para desenvolver mercados ambientais o que deverá facilitar a gestão de «trade-offs» entre usos alternativos. O mais óbvio é o mercado de emissões (ou redução) de CO(índice 2). Hoje em dia já se comercializam certificados de carbono.
Num contexto de alterações climáticas e de urgência na mitigação do aumento na concentração atmosférica de gases com efeito de estufa (GEE), a importância da gestão florestal, face ao seu papel para o sequestro do carbono, aumenta, tendo sido a sua adopção consubstanciada por Portugal, como sumidouro opcional, ao abrigo do Protocolo de Quioto.
2.6 – Democratização e urbanização.
2.6.1 – Urbanização e despovoamento rural.
Um dos principiais factores da mudança no sector florestal reside nas alterações do contexto socio-económico em que o mesmo opera, e cuja evidência se traduz no despovoamento humano das zonas rurais e na urbanização acelerada do litoral e dos modos de vida, alterações que acompanham as tendências que se têm vindo a verificar em toda a Europa.
Nos últimos 30 anos, de um modo geral, a população portuguesa emigrou para a zona litoral e para os centros urbanos localizados tanto no litoral como no interior, e essa tendência continua a verificar-se (Fig. 26).
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As zonas costeiras são, por isso, fundamentais para a sociedade representando situações muito especiais não só em termos biofísicos pela influência directa ou indirecta do mar (ventos, salinidade, etc.) mas também em termos dos sistemas socio-económicos associados pelo que justificaram, no passado, como justificam no presente, abordagens estratégicas particulares.
Em termos biofísicos, a fixação das dunas pela arborização constituiu prioridade estratégica desde os primeiros Reis de Portugal, à semelhança do que se fazia nas landes francesas. Prioridade retomada, no início do século XIX, no trabalho pioneiro de Andrade e Silva. Nessa altura, o governo francês iniciou a arborização das dunas da Gasconha, onde, a partir do processo iniciado em 1801, ficariam arborizadas logo em 1874 cerca de 90 mil hectares de dunas. Em Portugal, o Relatório àcerca da Arborização Geral do País de 1868 apontava como prioritária a arborização das áreas incultas de todo o litoral, estimadas em 72 mil hectares, que começaram a ser arborizadas a partir do estabelecimento do Regime Florestal (1901-1903). Nesta sequência as áreas do domínio privado do Estado, que representam na actualidade 66 mil hectares, correspondem, em grande medida, à floresta de protecção das zonas costeiras (Fig. 27).
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Mas, para além das ameaças dos agentes físicos, a mudança de contexto das últimas décadas tem sido especialmente problemática pela degradação acelerada da paisagem resultante do «crescimento descontrolado dos núcleos urbanos», por sua vez determinado pela coincidência da maior concentração populacional na zona costeira e pelo facto de «a capacidade de gestão do litoral não ter progredido conforme a capacidade de transformação criada pelo progresso tecnológico» como bem refere Ilídio de Araújo. Mas o mesmo autor recorda que, paradoxalmente, é o litoral a principal zona recreativa do território português, que apresenta ainda a atracção adicional de inúmeros testemunhos arqueológicos antigos (povoados, fortificações de diversas épocas, etc.).
Soluções para estas pressões sobre o litoral foram encontradas noutros países pela alteração de propriedade, como o processo mais directo de assegurar uma protecção duradoura de zonas especialmente vulneráveis.
Foi esta a abordagem feita no Reino Unido, onde a necessidade de protecção de sítios de interesse histórico e beleza natural conduziu, em 1895, ao estabelecimento de uma Fundação, o «National Trust», cujo estatuto foi reconhecido pelo Estado em 1907, conferindo-lhe o poder de declarar as suas propriedades como inalienáveis, de proceder à sua gestão, e de beneficiar de reduções fiscais muito significativas. Um século depois da sua constituição o «National Trust» geria mais de 270 mil hectares e protegia 850 km de costa do Reino Unido.
Em França depois do processo de arborização das dunas e da sua gestão pelos Serviços Florestais do Estado reconhecia-se, ainda assim, que «o desenvolvimento económico, as infra-estruturas de transporte e outras, e a urbanização conduziam lentamente ao desaparecimento dos meios naturais, à agressão da biodiversidade litoral e à degradação das paisagens nas zonas costeiras», razão que levou à criação, em 1975, do Conservatório do Litoral. Esta entidade pública, de uma forma equivalente à do «National Trust» do Reino Unido, concretiza a opção da aquisição das zonas mais frágeis e ameaçadas, substituindo-se aos proprietários privados quando o interesse público o exija. No entanto, a originalidade deste processo reside no facto de a gestão dos patrimónios adquiridos pelo «Conservatoire» ser feita por protocolo com os serviços florestais, outras instituições públicas, autarquias e colectividades locais, ou associações especializadas. Este processo vem permitindo o crescimento regular da propriedade do Estado no litoral fazendo com que, em vinte anos, o «Conservatoire» passasse a assegurar a protecção de mais de 50 mil hectares de património próprio, incluindo espaços florestais geridos pelos serviços florestais (ONF). A sinergia entre os dois organismos públicos tem permitindo assegurar um progressivo aumento da área de florestas de protecção em zonas costeiras e uma adequada gestão dessas áreas em mais de 830 km da costa francesa.
2.6.2 – Os novos actores da floresta.
Até aos anos setenta, os actores que intervieram no sector florestal foram de três categorias bem definidas: os proprietários privados, os industriais e o Estado proprietário-polícia. O 25 de Abril abriu o espaço para que muitas reivindicações latentes em relação à floresta se formalizassem. Assim como noutras áreas da actividade económica, houve necessariamente processos de ajustes e correcções de iniquidades anteriores, de aparecimento de actores novos reivindicando direitos legítimos, e um processo complexo de negociação e resolução de conflitos que gerou instabilidades. Até pelo facto de o sector ter sido especialmente favorecido por regimes não democráticos estas correcções foram maiores no sector florestal.
Entre os novos intervenientes no sector destacam-se, pela importância que têm hoje, as organizações associativas (associações e cooperativas florestais, assembleias de compartes nos baldios e associações de caça e pesca), as autarquias, e as organizações não governamentais, principalmente as de carácter ambiental. Este período também se caracterizou pela mudança rápida de governos, em contraste com a permanência que se verificara anteriormente, com implicações na estabilidade das políticas e na produtividade legislativa, o aparecimento e desaparecimento de instituições do sector e ou mudanças nas responsabilidades institucionais, e uma multiplicidade de instrumentos de intervenção pública.
2.6.2.1 – Propriedade e proprietários florestais privados.
A grande representatividade e particular visibilidade que os proprietários privados alcançaram na segunda metade do século XX, torna imperioso para a definição de estratégias para o sector perceber as suas especificidades e as características estruturais das propriedades que detêm.
Em relação à propriedade a falta de Cadastro para grande parte da área florestal prejudica o conhecimento e limita muitas dinâmicas do sector. No entanto é possível verificar uma distribuição geográfica muito marcada da dimensão da propriedade. Na Fig. 28 apresentam-se os números de prédios rústicos por NUTS II, confirmando que o grande número de prédios se situa no Norte e Centro do Continente, explicando que seja nessas áreas que falte o Cadastro. A distribuição concelhia da dimensão média dos prédios rústicos também pôde ser estimada através do quociente entre as áreas de cada concelho (depois de subtraídas as respectivas áreas sociais) e o número de artigos rústicos, a partir do registo da Direcção Geral dos Impostos (Fig. 28).
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A relação entre a dimensão da propriedade, as espécies florestais, e as características de gestão florestal e os objectivos dos proprietários privados foi efectuado por Baptista e Santos (2005) a partir da realização de inquéritos, identificando cinco tipos de situações, resumidas no Quadro 2.

QUADRO 2
Principais características das propriedades e dos proprietários florestais privados estudados (adaptado de Baptista e Santos, 2005)
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2.6.2.2 – Organizações de produtores florestais.
Em face das reduzidas dimensões associadas à generalidade dos prédios rústicos, com particular incidência nas regiões Norte e Centro, a obtenção de áreas mínimas de gestão está muito dependente das atitudes e formas de estar dos proprietários que as detêm e implica forçosamente figuras de agrupamento que poderão ter diferenças quanto à sua intensidade.
Estas figuras podem consistir apenas na associação para uma gestão comum, como seja pela criação de zonas de intervenção florestal (ZIF) – Decreto-Lei n.º 127/2005 cujos objectivos fundamentais são: a promoção da gestão sustentável dos espaços florestais que as integram; coordenação, de forma planeada, da protecção de espaços florestais e naturais; redução das condições de ignição e de propagação de incêndio; recuperação destes espaços. Assim, é estimulada a criação de dimensão que possibilita ganhos de eficiência por via do ordenamento e emparcelamento das propriedades florestais e desincentiva o seu fraccionamento.
Outras formas de agrupamento podem acontecer por via do associativismo e cooperativismo florestal; ou da dinamização de fundos de investimento imobiliário.
O associativismo florestal integra organizações diferenciadas quando à abrangência dos seus objectivos, incluindo as que se dedicam exclusivamente a actividades ligadas ao ordenamento e gestão florestal (Associações e Cooperativas Florestais) e as que desenvolvem outras actividades ligadas ao sector agrário (Associações Agro-florestais e Cooperativas Agrícolas com secção florestal). A partir da 1977 o número de organizações de produtores florestais cresceu de forma notável estando registadas no momento 163 (Fig. 29).
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Oficialmente são reconhecidos três tipos de organizações representativas dos proprietários e produtos florestais (Decreto-Lei n.º 166/2000, publicado no Diário da República, n.º 180, 1.ª série-A, de 5 de Agosto): (i) associações e cooperativas, de âmbito nacional, regional ou local; (ii) uniões e federações de associações e de cooperativas; e (iii) confederações de âmbito nacional (Quadro 3).

QUADRO 3
Organizações de Produtores Florestais (OPF)
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Confederações – CAP (Confederação da Agricultura Portuguesa); CONFAGRI (Confederação Nacional das Cooperativas Agrícolas e do Crédito Agrícola de Portugal); CNA (Confederação Nacional de Agricultura).
Federações – FENAFLORESTA (Federação de Cooperativas de Produtores Florestais); FORESTIS (Associação Florestal de Portugal); FPFP (Federação de Produtores Florestais de Portugal); BALADI (Federação dos Secretariados dos Baldios).
Uniões – UNAC (União da Floresta Mediterrânica).
O incremento no movimento associat

Veja também

Decreto-Lei n.º 257/2009, de 24 de Setembro

Estabelece o regime de derrogações aplicáveis à inscrição, produção, certificação e comercialização de variedades de conservação de espécies agrícolas, transpondo para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2008/62/CE, da Comissão, de 20 de Junho, que prevê determinadas derrogações aplicáveis à admissão de variedades autóctones e variedades agrícolas naturalmente adaptadas às condições regionais e locais e ameaçadas pela erosão genética, bem como à comercialização de sementes e batata-semente dessas variedades