Decreto-Lei n.º 129/2008, de 21 de Julho

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Decreto-Lei n.º 129/2008

PÁGINAS DO D.R. : 4507 a 4510

A Lei n.º 58/2005, de 29 de Dezembro, que aprovou a Lei da Água, transpondo para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 2000/60/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro, estabeleceu as bases e o quadro institucional para a gestão sustentável das águas.

A Lei da Água instituiu os planos de ordenamento dos estuários como planos especiais de ordenamento do território, a par dos planos de ordenamento de albufeiras de águas públicas, dos planos de ordenamento da orla costeira e dos planos de ordenamento de áreas protegidas, alterando para o efeito o n.º 3 do artigo 42.º do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 310/2003, de 10 de Dezembro.

Os planos de ordenamento dos estuários visam a protecção das suas águas, leitos e margens e dos ecossistemas que as habitam, assim como a valorização ambiental, social, económica e cultural da orla terrestre envolvente e de toda a área de intervenção do plano.

Contudo, considerando as especificidades destes planos, a Lei da Água remeteu o seu regime para legislação específica, o qual agora se apresenta, tendo em consideração o seu âmbito de intervenção, o seu objecto e os seus objectivos específicos, bem como as regras técnicas a observar na sua elaboração.

Foi ouvida a Associação Nacional de Municípios Portugueses.

Assim:

Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:

Artigo 1.º

Objecto

O presente decreto-lei estabelece o regime dos planos de ordenamento dos estuários, abreviadamente designados POE.

Artigo 2.º

Natureza e regime

Os POE são planos especiais de ordenamento do território, aos quais se aplica o regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial, com as especificidades constantes do presente decreto-lei.

Artigo 3.º

Âmbito de intervenção

1 – Os POE têm por objecto o estuário e a orla estuarina.

2 – O estuário é constituído pelas águas de transição e pelos seus leitos e margens.

3 – A orla estuarina corresponde a uma zona terrestre de protecção cuja largura é fixada na resolução do Conselho de Ministros que aprovar o POE até ao máximo de 500 m contados a partir da margem, sem prejuízo do disposto no número seguinte.

4 – Nos perímetros urbanos definidos nos planos municipais de ordenamento do território, integrados na zona terrestre de protecção, os POE apenas dispõem sobre regras e medidas de protecção, salvaguarda, valorização e qualidade dos recursos hídricos, em conformidade com o disposto na Lei da Água e nos seus termos.

5 – São objecto de um POE os estuários referidos no anexo i ao presente decreto-lei, que dele faz parte integrante.

6 – Por despacho do membro do Governo responsável pelas áreas do ambiente e do ordenamento do território pode ser objecto de POE, a título excepcional devidamente fundamentado, estuário não identificado no anexo i em relação ao qual venha a verificar-se a elevada relevância ambiental do meio hídrico em causa.

Artigo 4.º

Objectivos

1 – Os POE visam a protecção das suas águas, leitos e margens e dos ecossistemas que os habitam, na perspectiva da sua gestão integrada, assim como a valorização ambiental, social, económica e cultural da orla estuarina, através dos seguintes objectivos gerais:

a) Proteger e valorizar as características ambientais do estuário, garantindo a utilização sustentável dos recursos hídricos, assim como dos valores naturais associados;

b) Assegurar a gestão integrada das águas de transição com as águas interiores e costeiras confinantes, bem como dos respectivos sedimentos;

c) Assegurar o funcionamento sustentável dos ecossistemas estuarinos;

d) Preservar e recuperar as espécies aquáticas e ribeirinhas protegidas ou ameaçadas e os respectivos habitats;

e) Garantir a articulação com os instrumentos de gestão territorial, planos e programas de interesse local, regional e nacional, aplicáveis na área abrangida pelos POE.

2 – São objectivos específicos dos POE:

a) Definir regras de utilização do estuário, promovendo a defesa e qualidade dos recursos naturais, em especial dos recursos hídricos, de acordo com o disposto na Lei da Água e tendo em conta as disposições do Decreto-Lei n.º 77/2006, de 30 de Março, indicando as medidas de protecção e valorização dos recursos hídricos a executar, nomeadamente as medidas de conservação e reabilitação da zona costeira e estuários;

b) Definir regras e medidas de utilização da orla estuarina, com consideração dos instrumentos de gestão territorial aplicáveis, que permitam uma gestão sustentada dos ecossistemas associados;

c) Identificar as áreas fundamentais para a conservação da natureza e da biodiversidade no estuário e na respectiva orla e, nos casos em que tal se justifique, estabelecer níveis diferenciados de protecção;

d) Estabelecer os usos preferenciais, condicionados ou interditos na área abrangida pelo plano, salvaguardando os locais de especial interesse urbano, recreativo, turístico, paisagístico, ambiental e cultural.

3 – Quando sobre a área de intervenção de um POE incidir, total ou parcialmente, um plano de ordenamento de área protegida, o POE estabelece, na área de sobreposição dos dois planos, apenas as regras de utilização do estuário no que respeita à defesa, valorização e qualidade dos recursos hídricos.

4 – Quando a área de intervenção de um POE abranger uma área ou zona portuária, constituem ainda objectivos do plano a garantia das condições para o desenvolvimento da actividade portuária e a garantia das respectivas acessibilidades marítimas e terrestres.

5 – Para efeitos do número anterior, entende-se como actividade portuária o conjunto das actividades directa ou indirectamente associadas a um porto, nomeadamente a navegação comercial, turística e desportiva, a pesca, a gestão da área ou zona portuária e das áreas logísticas associadas.

Artigo 5.º

Elaboração dos POE

1 – Compete às Administrações das Regiões Hidrográficas, I. P., abreviadamente designadas ARH, I. P., elaborar os POE, de acordo com as condições estabelecidas no despacho do ministro competente em razão da matéria, nos termos previstos no regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial.

2 – A competência referida no número anterior pode ser cometida ao Instituto da Água, I. P., abreviadamente designado INAG, I. P., mediante despacho do ministro competente em razão da matéria.

3 – Nos casos em que a área de intervenção de um POE coincida, total ou parcialmente, com uma área protegida integrada na Rede Nacional de Áreas Protegidas, a elaboração do POE deve ser realizada em colaboração com o Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade, I. P., abreviadamente designado ICNB, I. P., nos termos a definir no despacho previsto no n.º 1.

4 – É garantida a intervenção de todos os municípios abrangidos pelo POE na sua elaboração, nos termos previstos no regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial para os planos especiais de ordenamento do território.

Artigo 6.º

Apresentação de pedido

1 – Nos casos em que um determinado uso ou utilização estejam sujeitos a parecer ou a acto autorizativo do ICNB, I. P., ou das ARH, I. P., o pedido pode ser entregue junto de qualquer uma das referidas entidades.

2 – No caso de a entidade junto da qual o pedido foi entregue não ter competência para a sua apreciação, esta deve-o remeter obrigatoriamente para a outra entidade.

Artigo 7.º

Pareceres

Quando sobre a mesma área incidir, simultaneamente, um plano de ordenamento de área protegida e um POE, que condicionem a realização de actos e actividades a parecer, autorização ou licença do ICNB, I. P., ou das ARH, I. P., a sua emissão é precedida de consulta à outra entidade.

Artigo 8.º

Fiscalização

A fiscalização do cumprimento das regras a fixar nos POE, a aprovar, compete às ARH, às autoridades marítimas e portuárias, ao ICNB, I. P., às autarquias locais e às autoridades policiais.

Artigo 9.º

Elementos que acompanham os POE

Para além dos elementos expressamente referidos no n.º 2 do artigo 45.º do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 316/2007, de 19 de Setembro, e na Portaria n.º 137/2005, de 2 de Fevereiro, os POE devem ainda ser acompanhados de um programa de medidas de gestão, protecção, conservação e valorização dos recursos hídricos abrangidos pelo plano, bem como da orla estuarina.

Artigo 10.º

Normas técnicas

1 – As normas técnicas de referência a observar na elaboração dos POE são as constantes do anexo ii ao presente decreto-lei e que dele faz parte integrante.

2 – As normas referidas no número anterior podem ser regulamentadas por portaria do membro do Governo responsável pelas áreas do ambiente e do ordenamento do território, ouvido o INAG, I. P.

Artigo 11.º

Regime subsidiário

Em tudo o que não estiver previsto no presente decreto-lei, relativamente aos POE, aplicar-se-á o disposto na Lei da Água e no regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial.

Artigo 12.º

Entrada em vigor

O presente decreto-lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 5 de Junho de 2008. – José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa – Rui Carlos Pereira – Francisco Carlos da Graça Nunes Correia – Manuel António Gomes de Almeida de Pinho – Jaime de Jesus Lopes Silva – Mário Lino Soares Correia.

Promulgado em 7 de Julho de 2008.

Publique-se.

O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva.

Referendado em 9 de Julho de 2008.

O Primeiro-Ministro, José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.

ANEXO I

(a que se refere o artigo 3.º)

Estuários que serão objecto de um plano de ordenamento de estuário:

Estuário do rio Douro;

Estuário do rio Vouga;

Estuário do rio Mondego;

Estuário do rio Tejo.

ANEXO II

(a que se refere o artigo 10.º)

Normas técnicas de referência a observar na elaboração dos planos de ordenamento dos estuários

Os planos de ordenamento dos estuários devem abordar os seguintes aspectos:

a) Identificação da área de intervenção, incluindo a delimitação dos limites de montante e jusante das águas de transição;

b) Identificação e breve caracterização de uma área adjacente à orla estuarina susceptível de influir nas condições e tendências de ocupação, evolução e transformação da área objecto do plano, com base nos instrumentos de gestão territorial em vigor, destacando os principais problemas e potencialidades que se perspectivam para a área em estudo, com referência a planos e projectos existentes;

c) Caracterização da área de intervenção quanto à situação existente, nomeadamente a caracterização física e ecológica da área de intervenção e identificação das pressões resultantes das actividades humanas com base em levantamentos sistematizados da utilização actual, bem como os principais problemas e potencialidades que se perspectivam para a área a estudar com referência a planos e projectos existentes e que atenda aos seguintes aspectos:

i) Levantamento e caracterização da ocupação actual do solo avaliando em termos quantitativos e qualitativos a evolução verificada nos últimos anos;

ii) Levantamento e caracterização das infra-estruturas ligadas aos transportes marítimos, à agricultura, à pesca, aos transportes, ao turismo, ao desporto e ao recreio náutico (existentes, em execução e programadas);

iii) Caracterização socioeconómica, identificando eventuais conflitos ao nível das actividades existentes, e entre estas e os valores naturais, culturais e patrimoniais;

iv) Caracterização dos núcleos urbanos, quando existentes, designadamente quanto à sua dimensão, sua integração a nível social, económico e ambiental, bem como as suas perspectivas de evolução;

v) Identificação e caracterização das fontes poluidoras no estuário e nos seus afluentes;

vi) Identificação e caracterização das situações de risco naturais e ambientais (risco de erosão, inundação, áreas de sensibilidade ao fogo, desprendimento de terras, poluição, habitats em risco, etc.);

vii) Identificação do património arqueológico existente na área do plano, suportada em estudos e informação disponíveis;

d) Caracterização biofísica da área de intervenção atendendo nomeadamente aos seguintes aspectos:

i) Fisiografia;

ii) Geologia, hidrogeologia e geomorfologia terrestre e subaquática;

iii) Sistemas naturais de maior sensibilidade;

iv) Fauna, flora e vegetação;

v) Comunidades estuarinas;

vi) Zonas de elevado valor ambiental, ecológico e paisagístico;

e) Caracterização da zona estuarina, nomeadamente através dos seguintes aspectos:

i) Hidrodinâmica lagunar e costeira;

ii) Caracterização das massas de água de acordo com a Directiva n.º 2000/60/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro;

iii) Caracterização da qualidade ecológica da água;

iv) Identificação das principais infra-estruturas hidráulicas existentes, em curso e programadas, no estuário e linhas de água afluentes, que possam ter influência no comportamento hidrodinâmico e qualidade da água;

v) Identificação e avaliação de outros usos com impactes significativos sobre o estado das águas de superfície;

f) Diagnóstico da situação existente, nomeadamente através da identificação dos desafios externos, das potencialidades e condicionamentos, face aos desafios previstos, e formulação e avaliação de cenários de protecção e desenvolvimento;

g) Desenvolvimento de um quadro estratégico de referência, onde se incluam, face à avaliação dos cenários alternativos, uma proposta de objectivos e linhas orientadoras para a área de intervenção do plano;

h) Elaboração da proposta de plano que reflicta uma estratégia de ordenamento para o estuário e respectiva orla, onde sejam claras as opções tomadas tendo por objectivo garantir um desenvolvimento equilibrado e compatível com as características naturais, sociais e económicas da área do plano, com a identificação de níveis diferenciados de protecção em razão da importância dos valores em causa;

i) Elaboração do programa de execução, indicando as áreas estratégicas para implementação do plano, identificando os investimentos a realizar, estabelecendo a calendarização dos mesmos e prioridades de execução e o enquadramento institucional das acções estratégicas e definindo as necessárias medidas de articulação;

l) Elaboração do programa de financiamento considerando a estimativa dos custos faseados em curto, médio e longo prazos e a previsão de fontes de financiamento.

Veja também

Portaria n.º 763/2009, de 16 de Julho

Sexta alteração à Portaria n.º 1202/2004, de 17 de Setembro, que estabelece as regras nacionais complementares relativas ao 1.º ano de aplicação do regime do pagamento único, previsto no título III do Regulamento (CE) n.º 1782/2003, do Conselho, de 29 de Setembro, bem como nos Regulamentos (CE) n.os 795/2004 e 796/2004, ambos da Comissão, de 21 de Abril